Edição
26 – artigo 3 05/09/2000
Sabedoria antiga
Quer se
preparar para o futuro? Aprenda com o passado. É lá que estão as mais profundas
verdades da natureza humana.
Por Tom Morris
Por
milhares de anos, os filósofos procuraram compreender a natureza humana.
Estiveram em busca da sabedoria sobre a melhor maneira de viver. Os mais
brilhantes fizeram profundas descobertas, que resistiram ao teste do tempo,
sobre a excelência e sobre o sucesso.
Mais do que nunca, em toda a
História humana, precisamos de sabedoria sólida. O ritmo das mudanças em nosso
mundo é o mais rápido já alcançado. E o futuro nos acena com uma aceleração
ainda maior em termos de inovação tecnológica, globalização e reconfiguração do
modo como trabalhamos e competimos em todas as atividades. Somente tomando como
base as mais profundas e imutáveis verdades acerca da natureza humana,
estaremos aptos a lidar com todas as coisas mutáveis à nossa volta. Estou
convencido de que muitos aspectos da antiga sabedoria podem nos preparar, de
maneira única, para tirar o máximo proveito das oportunidades de negócios com
que o futuro nos brindará. Vamos a eles:
AUTOCONHECIMENTO E SUCESSO
Na Antiguidade, muitas pessoas
procuravam os conselhos do filósofo pré-socrático Tales. Em resposta a questão
"Qual a coisa mais difícil do mundo?", ele_dizia, muito simplesmente:
"Conhecer-se a si mesmo". Quando lhe perguntavam "Qual a coisa
mais fácil do mundo?", Tales replicava "Aconselhar as outras pessoas”.
E quando lhe colocavam uma terceira questão, "De todas as coisas, o que
causa maior satisfação?", o filósofo respondia: "O verdadeiro
sucesso".
Trata-se de uma série de
intuições iluminadoras. A coisa mais fácil do mundo é dar conselhos às outras
pessoas. É por isso que o mundo está tão repleto de gurus e comentaristas que
aconselham sem sair de suas poltronas. Conselho é uma das
mercadorias mais disponiveis do mundo. Mas bons conselhos, ironicamente, são
difíceis de encontrar. Os que se aproximavam de Tales para levar suas questões
sobre a vida faziam bem em procurar um verdadeiro especialista em natureza
humana. E o filósofo não os desapontava.
Tales estava certo em cada uma
dessas respostas. Todos os pensadores antigos recomendavam insistentemente a
seus ouvintes a necessidade de se autoconhecer. Mas o autoconhecimento pode ser
a coisa mais difícil de atingir e de ser renovado. E, no entanto, pode-se
afirmar que é o fundamento mais importante para o que dá mais satisfação, que é
o verdadeiro e duradouro sucesso. É por esse motivo que o sucesso representa
tamanho desafio, nos negócios e na vida. Sem autoconhecimento, pessoas
talentosas e habilidosas estão desprovidas, em tudo o que fazem, de um dos alicerces
mais básicos do sucesso duradouro.
Todo trabalhador no século 21,
seja nas linhas de produção, seja nos escritórios, precisará ver a si mesmo
como um empresário independente, um vendedor especializado de serviços com uma
marca muito especial, conhecida de todos. Só isso nos ajudará a atrair
recursos, respeito e oportunidades que manterão o trabalho interessante, a
empresa poderosa e as carreiras florescentes. Mas isso requer uma grande dose
de autoconhecimento. É pela sua importância nas atividades mais criativas que
antigos filósofos, como Tales, queriam que compreendêssemos quão difícil é
alcançar o autoconhecimento. No futuro, com todas as suas possibilidades
criativas e empresariais, o ramo dos negócios exigirá mais do que nunca essa
rara mercadoria. Assim, faço coro aos antigos pensadores, recomendando:
"Conhece-te a ti mesmo".
AS CONDIÇÕES UNIVERSAIS DO SUCESSO NOS
NEGÓCIOS
O verdadeiro sucesso nos negócios e na vida envolve três coisas -
descobrir nossos talentos, desenvolvê-los e utilizá-los tanto para o bem alheio
quanto para o próprio bem. A essência do sucesso não reside, de modo algum, em
dinheiro, fama, poder, status, fatia do mercado ou lucro. Esses são meros
efeitos colaterais contingentes do verdadeiro sucesso. A substância do sucesso
envolve sempre autoconhecimento, crescimento pessoal e atividade
em um nível de excelência que produz grandes relacionamentos e resulta em
algo positivo para o mundo - nem mais nem menos. O verdadeiro sucesso em geral
se reflete nesses parâmetros externos que muitas vezes buscamos obsessivamente.
Mas jamais é encontrado quando se busca somente a eles.
Em meu livro True Success: A New Philosophy
of Excellence (publicado no Brasil como O Verdadeiro Sucesso,
Cultrix), apresentei sete condições universais de sucesso de acordo como eram
entendidas pelos maiores filósofos de todas as culturas, desde os tempos mais
remotos. Em cada desafio é preciso estruturar nossas ações e atitudes em torno
delas.
AS SETE CONDIÇÕES UNIVERSAIS DE SUCESSO
Em toda empresa, precisamos de:
1. Uma CLARA
CONCEPÇÃO do que queremos.
2. Uma FORTE
CONFIANÇA de que podemos atingir nosso objetivo.
3. Uma
CONCENTRAÇÃO FOCALIZADA no que faremos.
4. Uma CONSISTÊNCIA
OBSTINADA na busca do que almejamos.
5. Um
COMPROMISSO EMOCIONAL com o que estamos fazendo.
6. Um BOM CARÁTER
para nos guiar e manter no trajeto.
7. Uma
CAPACIDADE DE DESFRUTAR do processo.
Podemos encontrar uma
compreensão e apreciação desses sete pontos nos escritos de figuras tão
diversas quanto os antigos pensadores chineses Confúcio e Lao-Tsé, os estoicos
romanos Sêneca e Marco Aurélio e o jesuíta do século
17 Baltasar Gracián, ou em pensadores modernos como Ralph Waldo Emerson. O
sucesso em qualquer empreendimento é bastante facilitado quando essas sete
condições são seguidas. Por mais importantes que tenham sido no passado, estou
convencido de que serão ainda mais vitais para o sucesso nos negócios no
futuro.
MANTENDO O SUCESSO
O sucesso
duradouro nos negócios se baseia na compreensão e no respeito das necessidades
universais contidas na natureza humana. Os filósofos antigos diagnosticavam com
especial agudeza os motivos profundos que nos levam a dar o melhor de nós
mesmos em cada situação. E nos deixaram os mais diversos tipos de conselhos
sobre o que realmente importa em qualquer atividade humana. Tendemos com
frequência a pensar nos negócios em termos de produtos e processos, mas é um
terceiro elemento que acaba sempre sendo o mais importante - as pessoas que
fazem o trabalho. Processos eficientes e produtos de qualidade são vitais para
qualquer companhia que quiser ser bem-sucedida. Mas a fonte e o fundamento real
do sucesso duradouro é, em última instância, o espírito das pessoas envolvidas.
Muitos
dos antigos filósofos compreenderam que há quatro dimensões da experiência
humana que estruturam tudo o que sentimos e fazemos. Se pudermos apreender a
importância desses quatro fundamentos, podemos acumular mais energia para
nossos fins empresariais.
OS QUATRO FUNDAMENTOS DA EXCELÊNCIA
SUSTENTADA:
· A
dimensão INTELECTUAL da experiência e
sua meta, a VERDADE.
· A
dimensão ESTÉTICA da experiência e
sua meta, a BELEZA.
· À
dimensão MORAL da experiência e sua
meta, a BONDADE.
· A
dimensão ESPIRITUAL da experiência e
sua meta, a UNIDADE.
Expus a importância dessas
coisas em um livro intitulado If
Aristotle Ran Out General Motors: The New Soul of Business (Se Aristóteles Dirigisse a General Motors: O
Novo Espírito dos Negócios) e utilizei essas ideias para ajudar os lideres
de algumas das maiores companhias do mundo a compreender o que será necessário
para liderar no futuro. As pessoas precisam de uma certa dose de verdade,
beleza, bondade e unidade em sua experiência diária de trabalho. Se
respeitarmos e alimentarmos esses quatro preceitos em todas as nossas relações
com as pessoas, criaremos em nossas organizações um espírito de corporação mais
forte e novas formas de lealdade - que não dependem unicamente de condições
imprevisíveis de mercado -, tanto no interior de nossas companhias quanto com
os vendedores e clientes. Ao seguir esses princípios, alcançamos as raízes
profundas da motivação humana e fornecemos as condições para manter o sucesso
em tudo o que fazemos. O futuro dos negócios exigirá que compreendamos essas
intuições, que são as mais antigas, e as apliquemos em tudo o que fizermos.
LIDERANÇA EM TEMPOS DE MUDANÇA
O poema
épico Beowulf foi escrito, muito
provavelmente, no século 8 d.C., foi o primeiro grande texto literário da Inglaterra. Está recheado de intuições sobre liderança e advertências para realizadores de grandes feitos, coisas em que precisamos prestar atenção à medida que ingressamos no futuro.
Segundo o
relato, Beowulf se tornou o mais completo guerreiro de sua
época, vencendo repetidamente os inimigos mais duros. Sua reputação se
estabeleceu por séculos quando, ainda jovem, lutou com dois monstruosos
inimigos e venceu-os sozinho. Como resultado de sua força,
bondade, honestidade e grande renome tornou-se rei, e governou seu povo com justiça
por 50 anos. Seu reino foi então, repentinamente, ameaçado pelo mais feroz adversário
que ele jamais enfrentou, um horrível dragão que cuspia fogo.
Diante do
maior desafio de sua carreira, Beowulf
reuniu uma dúzia de homens para acompanhá-lo ao covil do dragão, mas levou-os como
testemunhas, não como companheiros de armas. Seu orgulho e seus hábitos, há
muito arraigados, determinaram que ele tentasse lutar sozinho com seu
adversário. A violência da luta foi tão grande gue os espectadores fugiram para
salvar suas próprias vidas, apesar de serem soldados experimentados. Mas seu
líder nunca os preparou para enfrentar os mais exigentes desafios - ele sempre
cuidou sozinho das grandes tarefas. E assim, quando o maior de todos os testes
surgiu, eles estavam despreparados para ajudar. Exceto um jovem, Wiglaf, que permaneceu e se apressou em
lutar ao lado de seu líder. Juntos, "em parceria", diz o poeta, eles
derrotaram o dragão, mas não sem que Beowulf
fosse mortalmente ferido.
Esse
grande homem encontrou a morte porque não foi capaz de mudar quando era
necessário. Nada garantia que o que funcionou em sua juventude funcionaria em
seus últimos anos. Mas ele era orgulhoso. E tinha hábitos que o fizeram agir de
uma maneira quando outra era a mais apropriada. O antigo filósofo Cícero
recomendara, muito antes, que devemos estar preparados, à medida que passam os
anos, a nos adaptar a novas maneiras de agir no mundo e a ensinar a outros, com
parcerias - mediante as quais podemos deixar nossa marca mesmo numa idade
avançada.
Isso
deveria servir de aviso para todos nós. O que funcionou no passado nem sempre se revelará a melhor
estratégia no futuro. Não podemos deixar que nossos hábitos e orgulho impeçam a
abertura e a mudança. Precisamos de fato do autoconhecimento para evitar nos
tornar nossos piores inimigos em tempos de mudança.
A lição
final de Beowulf é que nenhum de nós
pode fazer as coisas mais importantes sozinho. A parceria, a colaboração e a aliança
são as chaves para enfrentar os mais assustadores desafios com os quais nos defrontamos. E o
futuro dos negócios requererá isso mais do que nunca.
Existe
muita sabedoria para o futuro dos negócios nas obras dos grandes filósofos,
sabedoria a que precisamos prestar atenção e incorporar, se quisermos que o
futuro seja o melhor possível.
O
professor de filosofia da Universidade de Notre-Dame, é um dos mais populares
escritores americanos de negócios dos últimos tempos. Seus livros e palestras
ensinam homens e mulheres de negócios a usar a sabedoria de filósofos como
Sócrates e Aristóteles para enfrentar os desafios de hoje. Ph.D. em filosofia e
estudos religiosos pela Universidade de Yale, o professor Morris é conhecido por
seu comportamento pouco usual. Não esperem um acadêmico sisudo e cheirando a
mofo. Você vai vê-lo mais facilmente num show de rock, tocando sua guitarra, e
em programas de televisão da rede NBC, divulgando filosofia antiga.
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