O mundo está doente!
17/04/2019

Não se trata da natureza, essa sabe se defender, trata-se isto sim, do ataque de um organismo desequilibrado, o ser humano, e esse ataque não é à natureza, mas à sua própria espécie.

O ser humano é um animal esquizofrênico, parte competitivo e predador, parte colaborativo e social. Pensa ser formiga sendo leão ao mesmo tempo.

A primeira característica é a essencial, instintiva, já a segunda é fruto exclusivamente da racionalidade, dos medos, portanto artificial, diferentemente do que ocorre com os insetos sociais, por exemplo, que tem como sua natureza essencial a vida em coletivos.

A primeira acelera, a segunda só serve como freio.

Não reconhecer esse fato tem levado à moléstia que induz os mais absurdos sofismas e, finalmente, poderá nos conduzir à extinção, coisa que a natureza agradecerá aliviada.

Imaginar que nossa natureza é sermos civilizados e racionais e relegar nosso lado animal como algo a ser reprimido é um dos maiores enganos da civilização.

Já não são novidade os estudos sobre o comportamento, chegando ao prêmio Nobel de economia de 2017, Richard Thaler, com seus estudos de economia comportamental, demonstrando cientificamente que as decisões de consumo e demais transações econômicas não são racionais e sim resultado de complexas interações psicológicas.

Esse conflito gera enormes problemas para a sociedade humana.

As tensões se originam dessa esquizofrenia de defender ideias altruístas e agir de forma egoísta.

No fundo é o conflito entre o educado, espiritual, racional, artificial, ideal e o real, natural, instintivo, animal, selvagem, que afloram aqui e ali como uma força incontrolável, pedindo liberdade, porém, nossa condição de seres conscientes exige segurança, então nos abrigamos sob alguma proteção, um grupo político, uma religião, uma facção criminosa, uma milícia, qualquer coisa que apareça ao nosso alcance. Só não queremos, de repente, nos encontrar sós de frente aos monstros que nossa imaginação criou.

Nesse contexto todo conjunto de regras, seja de um governo nacional, de uma religião, ou qualquer outra forma de dirigir e limitar a ação do homem, se inclui no lado da artificialidade, enquanto apenas as iniciativas individuais, como a produção de bens ou as transações comerciais são iniciativas com origem nos impulsos naturais, em outras palavras, o mercado. É no mundo privado que a vida ocorre, o poder estatal deve regular os exageros apenas, já que representa o freio das atividades, não o acelerador.

Quem pensa em aderir a uma ideologia tem que pensar nisso, caso contrário poderá estar, não só embarcando numa barca furada, mas, principalmente, levando muita gente junto. Entretanto, o súcubo se deixa levar pelos ideais mais estúpidos, movido pela vaidade ou pela covardia, como se dominasse com profundidade as bases filosóficas, antropológicas e sociológicas de suas ideias. Na realidade, na maioria das vezes, nem mesmo reúne as condições de perceber os fundamentos dessas ideias, limitando-se ao discurso ingênuo e pobre do combate às desigualdades de um lado ou da liberação da economia de outro.

Lembrando que as desigualdades não devem ser combatidas e sim estimuladas, o que se pode desejar é a redução das carências, da extrema pobreza e, mesmo assim, apenas promover as melhores práticas, regular as transações o mínimo possível e desejar que isso ocorra.

Ignorar esse fato ontológico é o segundo maior problema para nossa sobrevivência como espécie, já que o primeiro é nossa racionalidade, qualidade que nos faz humanos, mas não elimina nossos instintos animais.

As ideias socialistas, por mais estúpidas que sejam, assim como alguns personagens dessa luta, nunca serão derrotados, nunca serão extintos, estarão sempre ressurgindo das cinzas para arder no inferno de novo e de novo e das cinzas brotar incessantemente. Como exemplo, sugiro pesquisar a queda de Churchill na Inglaterra do pós-guerra e a ascensão do socialismo naquele país - não seria perda de tempo pesquisar sobre as consequências dessa intervenção soviética na Grã-Bretanha.

Imaginar, por outro lado, que o capitalismo é o responsável pelas mazelas da sociedade é não ter nenhuma noção dos fundamentos que regem as sociedades humanas.

Essa é a lógica da sociedade humana: almejar a estabilidade e a segurança, ao mesmo tempo promovendo crises e aventuras.

Isso não é um problema simples, para resolver com palavras de ordem, e estamos vivendo uma enorme crise de diálogo, um momento em que todos estão entrincheirados em suas "certezas" eliminando as chances de construir novas soluções. Só evitando os erros do passado e usando o máximo de conhecimentos, intuições e ideias disponível podemos avançar, lembrando que a questão não é defender partidos ou personagens, mas ideias e ideias fundamentadas, não simples opiniões.

Uma especulação válida seria termos a sociedade humana comandada por uma inteligência artificial, entretanto a força da "vida" que comanda nossos instintos continuaria criando problemas - a vida sempre encontra um meio!

A explicação para isso é encontrada na observação das organizações, afinal, hoje, qualquer organização tem acesso aos métodos gerenciais e comerciais mais avançados, incluindo  a IA - desculpem o trocadilho besta - entretanto, empresas similares em quase tudo, como, por exemplo, a equipe Mercedes e a equipe Ferrari de F1, apresentam desempenho muito diferente. A alma de cada empresa, assim como a alma de cada indivíduo, é que define a competência de cada um e é através da transgressão, da rebeldia que a alma real se manifesta.

É a diferença entre motivação, algo racional, ideal e o entusiasmo, o que vem sem pedir licença.

Uma sociedade só vai se consolidar se houver liberdade para a alma de cada um exercer seu entusiasmo, por isso que as sociedades desse tipo carregam muitos problemas, porque a liberdade produz o melhor e o pior.

A necessidade de impor regras para minimizar essas mazelas deve ser muito ponderada porque se ultrapassar certos limites matará o entusiasmo.

Outra possibilidade é algo como o Waze, um conselheiro de IA que não nos constrange, apenas orienta nossas atitudes, permitindo a liberdade individual de decisão.

Hoje o panorama dessa discussão, sob o ponto de vista da busca de soluções consensuais é, para dizer o mínimo, tétrico, e as possibilidades de que essa situação seja revertida em médio e longo prazo são remotas, entretanto a história mostra que os rumos da sociedade podem mudar radicalmente de uma hora para outra, só podemos esperar.



Nós não podemos resolver um problema, com o mesmo estado mental que o criou.
Albert Einstein

Um problema crucial para cada um de nós é decidir, a cada momento, o que vamos considerar como parâmetros do problema "vida" e o que podemos considerar variáveis, ou seja, o que temos que nos conformar e seguir em frente e o que devemos lutar para alterar.

Senhor, dai-me força para mudar o que pode ser mudado...
Resignação para aceitar o que não pode ser mudado...
E sabedoria para distinguir uma coisa da outra.
São Francisco de Assis