Para lançar um pouco de trevas sobre o assunto.

A utopia de Moro

Por André Peixoto de Souza


Thomas Morus (ou Tomás Moro) foi um jurista e estadista inglês da corte de Henrique VIII, conhecido por haver se posicionado contra o rei na “questão Ana Bolena” e por haver escrito e publicado, bem no início do século XVI, dentre várias outras obras, o livro Utopia.
Nesse texto essencialmente humanista renascentista (e de evidente influência platônica e agostiniana), o autor apresenta uma ilha imaginária, chamada Utopia (u, negação; topos, lugar) que seria um protótipo da perfeição social, da mais plena harmonia em termos de convivência humana, um “não lugar” de rejeição do real (que está falido) e de esperança no ideal (que se deseja construir). Essa ilha acabou denominando o termo útil até hoje para significar uma sociedade perfeita ou ideal: utopia!
Na obra, antes de descrever a ilha, porém, Tomás Moro estabelece rigorosa crítica à Inglaterra tudoriana, quando “um bandos de ladrões e uma justiça cega” – ganância, glória e paixões – predominam sobre os singelos interesses do povo oprimido e miserável. É a corrupção desenfreada da monarquia centralizada, a sede por dinheiro e poder emanada por nobres e novos burgueses e o visível abismo entre as classes sociais que move o autor a escrever um duro enfrentamento sobretudo ao governo do rei Henrique VIII.
Todavia, na ilha – assim imaginada a partir do relato de seu amigo Américo Vespúcio, recém chegado do recém descoberto Brasil (diz-se que Utopia teria sido inspirada em Fernando de Noronha!) – é o bem comum que pauta toda sua estruturação.
A produção é dividida de forma igualitária, de modo a inexistir criminalidade ou mendicância. Não há, igualmente, propriedade privada, pois que o pressuposto de Utopia é a comunhão dos bens outrora particulares. Tem-se, aqui, uma outra lógica social-econômica (bem desenvolvida no século XIX): a terra serve para ser cultivada, e não simplesmente possuída.
Dinheiro – ouro e prata – são desprezíveis porquanto irrelevantes (ali não há prisão: os pouquíssimos criminosos são obrigados a usar anéis e correntes de ouro, uma forma de marcar cinicamente a inutilidade das materialidades). As profissões são escolhidas a partir das aptidões e interesses de cada utopiano, que servem a todos a partir da necessidade e da solidariedade.
Trabalho e liberdade pautam o seu cotidiano: seis horas diárias de serviços, duas horas diárias de repouso, oito horas diárias de lazer ou estudos, oito horas noturnas de sono. Residências, roupas e alimentos estão na mesma proporção, para todos. Não há quem seja superior a outrem por ter mais ou ser maior: ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer o que não queira. Há, ainda, escolas e hospitais bem estruturados, úteis a todos, igualmente.
Utopia preza, em primeiro lugar, pelo amor e reverência a Deus, criador de tudo e veículo único de felicidade humana; em segundo lugar, preza por alegria, conforto, solidariedade, cooperação, igualdade, liberdade, segurança, respeito, justiça. Utopia, “a nação mais civilizada do mundo”, é esse estado de pleno bem estar do ser humano, é utopia, é “não lugar”: inexistente, irreal, inatingível.
Da corte à prisão, Moro foi fiel aos seus princípios. Recusou-se a aceitar Henrique VIII como soberano da Igreja (Chefe Supremo da Igreja de Inglaterra). A mando do rei – então excomungado pelo Papa Clemente VII e, em seguida, fundador da Igreja Anglicana –, Moro foi processado, julgado, condenado e executado em praça pública (por decapitação a machadada) e sua cabeça foi exposta durante um mês na ponte de Londres.
Quatro séculos depois, não obstante, e após reconhecimento de seu martírio pela Igreja, foi canonizado pelo Papa Pio XI, e hoje é conhecido como São Tomás Moro. Foi, ainda, declarado Patrono dos Estadistas e Políticos pelo Papa João Paulo II.
Fonte: Canal Ciências Criminais

15/05/2017

Sentimentos são individuais,
nomes genéricos não os representam.
Os símbolos e signos, como os da linguagem,
reduzem sentimentos a ideias
causando o maior mal-entendido da comunicação:
confundir a generalidade dos objetos com o juízo que fazemos deles.

Meu bem, meu mal!

Estamos chegando em um momento crítico da saga do cavaleiro Moro contra os depauperadores da pátria. Isso pede uma reflexão sobre o que é o “bem” e o que é o “mal”, porque o resultado final de todo esse processo será altamente frustrante para quase todos, inclusive para o próprio Moro, afinal utopias são assim mesmo, foram feitas para não se realizarem.
É preciso frisar que não há dúvida de que nosso país encontra-se em um estágio de evolução muito atrasado quando comparado a algumas outras sociedades contemporâneas e que precisamos avançar no aprimoramento de nossas instituições, par e passo com a educação de nosso povo. Entretanto, não se pode esperar que milagres aconteçam, embora também me pareça que não haja dúvidas sobre os avanços já conseguidos.
É sobre esse “milagre esperado” que precisamos refletir um pouco. Como de costume, vamos começar do começo...

No princípio houve uma graaande explosão...

Desde a revolução cognitiva, ocorrida a cerca de 70.000 anos atrás, com o surgimento de uma nova espécie, o Homo Sapiens, da qual somos os mais recentes indivíduos, muitas outras revoluções ocorreram em nossa forma de pensar e de compreender o mundo, como a revolução científica, a revolução tecnológica etc.
Lembrando sempre que “primeiro vem o perceber, depois o compreender e... há controvérsias”.
O que sempre me intrigou é perceber que, ao mesmo tempo que desenvolvemos as ciências físicas e biológicas, que a filosofia explorou as mais variadas hipóteses, que exploramos aspectos sutis do pensamento, como a neurociência e a psicologia, que abrimos a discussão do conhecimento, permitindo que o debate livre de qualquer assunto alcançasse a todos e conduzisse a uma melhor compreensão do mundo e de nossa interação com ele, simultaneamente convivamos com crenças e doutrinas desenvolvidas em épocas cujo estágio de conhecimento e da cultura dominante eram extremamente precários.
Enquanto a ciência se consolida, não por dogmas, mas por experiência, afinal com ela chegamos até a Lua, desenvolvemos as vacinas e até conseguimos começar a entender os efeitos deletérios de nossas intervenções na natureza, continuamos conservando e até promovendo conceitos e fórmulas a partir de dogmas e crenças criados a milênios e baseados em escrituras e testemunhos sem nenhuma base que os corroborem.
Ainda que esse conjunto de referências contenha uma compilação importante de sabedoria milenar, com respeito aos ensinamentos morais e filosóficos, no que tange à linguagem utilizada, permeada de mitos, conceitos e definições que tentam explicar a realidade tangível e a intangível, povoando esta segunda de seres e ambientes desprovidos de qualquer consistência lógica ou de possibilidade experimental - talvez até com intenção metafórica - não é razoável insistir em sua validade e, não sendo “razoável”, não deveria se sustentar em uma época que pretende ser dominada pela “razão”.
Claro que as principais representantes desse lado obscuro do pensamento humano são as religiões, mas existem outras correntes, como a astrologia, a quiromancia, a numerologia etc., que também fazem parte dessa sombra cognitiva em que vivemos. Sem esquecer das pseudo ciências, filhas bastardas da própria ciência: logo após a descoberta científica do magnetismo surgiram as magneto terapias, mais recentemente, com o advento da física quântica, temos a medicina quântica e por aí vai.
De um modo geral, essas “correntes de pensamento” se vangloriam de permanecerem tal como foram criadas há milênios, como se isso fosse prova de sua “veracidade”.
Entre essas crenças estranhas está a distinção que muitos ainda fazem entre o “bem” e o “mal”, como se fossem entidades naturais e não invenções de nossa fértil imaginação.
É basicamente o medo do desconhecido que nos impede de reagir a isso, mas principalmente, o medo de nos reconhecermos como fonte do que chamamos “mal”.
Quando digo “nos reconhecermos” não me refiro ao reconhecimento enquanto espécie, mas sim dirigido a cada um de nós, indivíduos, porque todos nós somos geradores do “mal”, não apenas os “homens maus”.
Somos bons por conveniência e não há nenhum mal nisso, afinal, já disse Jorge: “se o malandro soubesse como é bom ser honesto, seria honesto só por malandragem”!
Nascemos animais e nos tornamos humanos pela educação. Se há o pecado original, precisamos lembrar que o batismo é para os pais, para que sejam marcados, em frente a todos, com a responsabilidade de transformar aquele animalzinho em um homem de bem.
O que faz com que algumas ideias, incompatíveis com nosso estágio de desenvolvimento, permaneçam imutáveis através dos séculos?
Um conteúdo filosófico e moral profundo, mas principalmente a superioridade com que seus pregadores exploraram o medo.
Muitas ideias surgiram ao longo dos séculos, a maioria fracassou em conquistar corações e mentes, as que prosperaram foram as que melhor utilizaram o medo.
Por incrível que possa parecer está em curso atualmente uma verdadeira contra revolução, não só admitindo conceitos há muito ultrapassados, como negando a importância fundamental do conhecimento científico, a ponto de obrigar uma parte considerável da sociedade a reagir, promovendo inclusive manifestações nas ruas, em defesa dessa que foi a única tentativa consistente de compreensão da realidade, a ciência.
Outra notícia neste link: Escola Mackenzie defende criacionismo.
Por uma estranha coincidência o argumento mais forte desses novos profetas do apocalipse é o… “MEDO”! Medo do terrorismo, medo da pobreza, medo dos “inimigos” etc. etc.
É bom deixar claro que ciência não é apenas o assunto dos malucos de avental que vivem enfurnados em laboratórios. Não! Ciência é uma forma de raciocinar, nascida do “penso, logo existo” de Descartes e que defende a busca da verdade da forma mais honesta possível, ainda que a verdade seja inatingível, mas a honestidade deve garantir até esse fato, o reconhecimento de que a verdade ainda não foi e talvez nunca será atingida, entretanto continuamos na sua busca porque é através desse processo que podemos aumentar nosso conhecimento e, portanto, as formas de atuar na realidade à nossa volta.

Podemos dizer que com a ciência, aceitamos nossa ignorância e, dessa forma, pudemos - embora nem sempre tenhamos exercido esse poder - rejeitar todo e qualquer falso profeta.
Acho que estamos suficientemente maduros para começar a discutir essas questões, livres desse medo ancestral que embota nossa mais importante capacidade, o raciocínio. Como na parábola do filho pródigo, devemos utilizar nossos dons no seu melhor potencial.
Nossa necessidade de conforto psicológico pode continuar a ser preenchida com rituais, conceitos sagrados e todo tipo de rito individual ou celebração coletiva que imaginarmos, afinal sempre disse que o mistério só pede “Ser Sagrado”, mas nada nos obriga a ignorarmos o que já sabemos pela via da ciência. O horizonte de conhecimento sempre será isso mesmo, um horizonte, pelo menos é no que eu acredito por via da lógica, ou seja, a ciência sempre esbarrará no mistério, o que não posso ignorar é aquilo que eu já sei.

Brancos  e Vermelhos

Interessante observar que essa necessidade de um ser supremo não é universal entre os homens, ainda existem culturas que encaram a vida de forma bem diferente.
Quando uso os estereótipos “branco” e “vermelho”, representando as correntes exploradora e conservativa nas sociedades humanas, sendo as primeiras mais próximas do homem branco civilizado e as últimas dos silvícolas sulamericanos, por exemplo, sempre saliento que as barreiras culturais entre esses grupos são tão intransponíveis que vão muito além do conflito de ideias, na verdade representam uma incompatibilidade lógica, de tal forma que um nem mesmo consegue entender o raciocínio do outro, muito menos concordar ou discordar.
Para o “branco” a conquista da natureza é condição necessária para sobreviver a essa mesma natureza, ou seja, o ser humano teria a condição e a missão de criar e modificar seu próprio habitat, dessa forma a intervenção sobre a natureza seria não só uma contingência, mas uma necessidade. Esse modo de pensar, antropocêntrico por excelência, gerou a ideia do “mal”, ou seja, tudo aquilo que, de alguma forma, nos impede de fazer o que queremos, de exercitar nosso “livre arbítrio” - este último também um constructo mental muito útil para essa forma de pensar - enfim, tudo que nos atrapalhe, seria uma manifestação do “mal”.
Essa visão de mundo criou os “teísmos”, mono ou poli, que colocam um “deus”, ou vários, como responsável pela criação e manutenção do universo, tendo no homem o ápice de sua obra e preocupação.
Para o “vermelho” isso é absurdo, já que, na sua forma de pensar, somos fruto da natureza e não podemos nos sobrepor a ela e nem mesmo sonhar com qualquer tipo de sobrevivência após a extinção do nosso habitat natural. Sua forma de encarar o mistério é mais sistêmica, onde não cabe a ideia de um “deus” supremo. Afinal, se houvesse um ser assim como poderia ajudar em alguma coisa?
Uma vez que esse ser sobrenatural seria responsável por tudo e, principalmente, pelo equilíbrio do universo, não haveria como ele interferir a favor de alguma coisa ou alguém sem provocar desequilíbrio. Para esses povos não existe “bem” e “mal”. Os opostos: frio e quente, alegria e tristeza, claro e escuro, são duas faces da mesma moeda, o que é bom para uns será mau para outros.
A visão de poder supremo para essas culturas é traduzida pela natureza, a “mãe Terra”, e os diversos espíritos que a habitam, o espírito da árvore, da pedra, do peixe, da montanha e assim por diante.
Quando se discute entre nós, ocidentais civilizados, a visão do mal descrita em algumas filosofias orientais, principalmente o taoísmo, é comum ouvir versões do tipo: - O equilíbrio entre bem e o mal determina a perfeição do universo. O mal, como poder destrutivo, é necessário para esse equilíbrio. Ignorá-lo é viver a ilusão de um paraíso terrestre! Como se essa fosse a essência daquele pensamento.
Na verdade, essa é a interpretação que o “branco” dá ao pensamento ouvido ou lido.
Não há, de fato, um conceito de “mal” nessas filosofias, mas apenas a percepção dos opostos, ou seja o que chamamos de “mal” não cria condições de equilíbrio, muito menos de perfeição, na verdade ele está aí porque nasceu do desequilíbrio gerado quando o universo começou a existir, ou seja, o fato de existir alguma coisa significa que houve uma ruptura com o Tao e dessa ruptura surgem os opostos, gerando um conflito que só cessará ao cessar a existência. Dessa forma, o “mal” está em cada um de nós e em cada coisa existente, sendo uma condição da existência num universo intrinsecamente imperfeito.
A base estrutural do universo é o conflito e o permanente desequilíbrio.

Não há “poder destrutivo” porque não há destruição, apenas transformação, vide Lavoisier. O pior é que, dessa forma de pensar, geramos um monte de conceitos derivados extremamente perniciosos, como o lixo, a sujeira, a pureza etc.
Esse é um exemplo de como as concepções que fazemos do que lemos ou ouvimos está totalmente formatada pela nossa visão de mundo.
Para o “branco” - em outras palavras, nós - esse entendimento foge ao que consideramos razoável (ou seria desejável?) e preferimos entender o “mal” como algo exterior e contingente.
Pois é, até quando nos esforçamos para interpretar essas filosofias, caímos na nossa própria armadilha: “universo perfeito”; “o mal é necessário para o equilíbrio”; “o mal é o poder destrutivo”.
É clara a ideia de que a perfeição é desejável e até, eventualmente, em condições ideais, possível e que o “mal” pode ser evitado ou até eliminado de nossas vidas.
Infelizmente, sucessivas filosofias e praticamente todas as religiões, usando o potencial de wishful thinking existente em nós, pregaram que o paraíso é alcançável, algumas defendendo a versão terrena, outras, com alternativas “espirituais”, mas todas contribuindo para a concentração de poder nas mãos de poucos líderes e solapando as possibilidades de evolução real das sociedades.
Admito até que essas iniciativas tenham sido necessárias em algum estágio da evolução humana, quando a percepção do indivíduo comum estava totalmente embotada na luta pela sobrevivência e, ao mesmo tempo, já brotava uma necessidade de algum tipo de estrutura social que lhe desse proteção, mas acredito que hoje já é possível ao menos iniciar um processo de desvencilhamento dessas amarras.
Já podemos aceitar que o mal existe porque existe. Voltando ao taoísmo, por exemplo - não estou pregando nada, apenas cito como referência de comparação - ele ensina que, exceto no Tao, que representa o nada, aquilo que deu origem à existência de tudo, não há possibilidade de perfeição.
E o Tao não passa de uma ideia, um conceito filosófico, cuja finalidade é servir de referência para a compreensão da realidade complexa. Nada nem ninguém pode experimentá-lo, nem durante nem após a vida, até porque, conforme essa filosofia, a morte é a reintegração ao Tao, ou seja, a desindividualização completa, a transformação pura e simples em energia, sem consciência ou ego.
A condição para existir é separar opostos e coexistir com eles, não para atingir qualquer tipo de perfeição, apenas para poder existir, é o preço da existência, o que para os seres vivos em geral é absolutamente incorporado em suas vidas, exceto para alguns dos sapiens que, por terem “comido do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal”, adotaram a visão maniqueísta que domina nossa civilização.
A própria ciência, aparentemente tão isenta, não existiria sem os financiamentos que políticos conseguem, políticos que são movidos a ideologias, paixões e vícios humanos. A ideia, por exemplo, de ciência pura, é uma “crença” de cientistas que imaginam que estão livres desses condicionantes, entretanto foram aliciados pelo sistema que, sorrateiramente, vai conduzindo esses bem intencionados trabalhadores, na direção daquilo que lhes convém. E isso nada tem de mau, ao contrário, se tivéssemos a liberdade de fazer o que quiséssemos da forma que bem entendêssemos nunca chegaríamos a lugar nenhum, seria mais ou menos como o governo populista que destina verbas irrestritas aos programas sociais e depois se vê asfixiado pelos banqueiros.
Bem e mal, corpo e espírito, certo e errado são apenas construções de nossa mente doentia.
Vejam o que diz Contardo Calligaris, escritor, psicólogo e psicanalista:



É mais fácil admitir a existência de uma doença do que a existência do mal
Editoria de Arte/Folhapress


Ilustração de Mariza Dias Costa para Contardo Calligaris


19/01/2017 02h00
Em junho de 2015, em Charleston (Carolina do Sul, EUA), Dylann Roof, 21 anos, atirou nos fiéis, todos negros, que estavam rezando na Emanuel African Methodist Episcopal Church, uma igreja antiga e gloriosa para a comunidade negra norte-americana -desde o tempo da escravatura até a época da luta pelos direitos civis. Foi por essa relevância simbólica que Roof escolheu o lugar do seu ataque.
Balanço: nove mortos e três feridos. No primeiro depoimento, Roof confessou sua matança rindo. E disse que pensava ter matado só quatro ou cinco, no máximo. Quando soube que eram mais, pareceu satisfeito.
Roof declarou ter agido na esperança de iniciar e fomentar assim, pelo seu ato, uma guerra racial.
Uma das vítimas lhe perguntou por que ele estava atirando. Roof o matou respondendo: "Vocês estupram nossas mulheres e estão assumindo o controle do nosso país. Vocês tem que ir embora".
Em dezembro de 2016, Roof foi reconhecido culpado por um tribunal federal. Em janeiro começou a segunda fase do processo, em que seria decidida a pena.
Nessa fase, Roof pediu para ser o advogado de si mesmo, porque não queria que seus defensores atenuassem sua culpa alegando sua insanidade mental. Contra a vontade de Roof, a defesa pediu que ele fosse declarado doente e incapaz de ser advogado de si mesmo.
Numa nota de seu diário, Roof escreveu: "Quero declarar que sou moralmente oposto à psicologia. É uma invenção judaica, que só inventa doenças e diz às pessoas que elas têm problemas que elas não têm".
Robert Dunham, que dirige o Death Penalty Information Center (centro de informação sobre a pena de morte) comentou: "Imaginemos que o júri enxergue Roof como mau, ou seja, como alguém que fez a escolha consciente e racional de matar pessoas inocentes e devotas, e isso, na intenção de fomentar o ódio racial. Nesse caso, a condenação de Roof à pena de morte é muito mais provável do que se o júri acreditasse que ele é uma pessoa jovem e profundamente doente, que agiu sob a influência de crenças racistas delirantes".
Ora, Roof não quer que suas ideias e motivações sejam consideradas doentias. Em 4 janeiro, na abertura da segunda fase do processo, ele disse aos jurados:
"Vocês devem ter ouvido que a razão pela qual eu escolhi ser advogado de mim mesmo é para evitar que meus advogados me apresentem de maneira errada. Isso é absolutamente correto."
"Eu me represento, não vou mentir sobre mim mesmo. Meus advogados me obrigaram a passar por duas audiências de capacidade mental, não porque eu teria um problema. [":] O ponto é que eu não vou mentir para vocês [":] Não há nada de errado comigo psicologicamente."
Entendemos facilmente de onde vem o horror que essa declaração nos inspira. Em síntese, para nós, é mais fácil admitir a existência de uma doença ou do erro do que a existência do mal.
Preferimos pensar que Roof esteja errado (mal-informado, extraviado pelas redes sociais etc.) ou, então, que seu erro seja efeito de uma tremenda neurose familiar ou de uma psicose a pensar que ele seja "apenas" alguém que pensa diferente de nós.
Imaginamos ser "tolerantes" e abertos, mas, no fundo, preferimos imaginar que quem pensa diferente de nós esteja doente. Numa briga, o último recurso do ódio é um "Vai se tratar", que condena tudo o que o outro diz e faz à irrelevância.
Enfim, onde estaria a doença de Roof?
1) Ele seria doente pelo que acredita e que motiva sua ação. OK, mas distinguir o "certo" do delirante não é simples. Muitas de nossas crenças são extravagantes quanto as de Roof; só não percebemos sua extravagância porque as compartilhamos com muitos outros. Um delírio coletivo não parece mais um delírio (pense nos dogmas religiosos, por exemplo).
2) Ele seria doente por causa da certeza absoluta, que o impede de discutir e mudar de opinião. De fato, na clínica, a sensação de certeza incontestável é a marca do delírio. Mas essa certeza se tornou hoje um sintoma social banal: é por isso que, na internet, parece que todos procuram apenas o que confirma suas crenças.
Em suma, Roof pode ser louco, mas não é fácil dizer por quê.
Agora, para Roof ser considerado doente implicaria a irrelevância de seus pensamentos e de seu ato, como "coisa de louco". Seria melhor e mais digno ser condenado à morte, como ele foi em 13 de janeiro. A execução, como sempre acontece, vai levar tempo.
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A seguir um outro texto sobre a promiscuidade entre “bem” e “mal” em nossa sociedade. Achei muito interessante para aclarar a percepção do mundo em que vivemos.
Lembro que Frank Sinatra foi o mais insignificante dos trabalhos do Sr. Giancana, já que ele fez um dos presidentes mais importantes dos Estados Unidos da América: John Fitzgerald Kennedy.
Faço uma ressalva ao uso da palavra “julgo” no texto, acho que o correto seria jugo, no sentido de controle.

Clique neste link: O Poderoso Chefão: a ascensão das famiglias e sua influência



A expulsão do paraíso

Essa condenação a que nós nos impusemos ao comer da árvore do conhecimento do bem e do mal, não foi um fato definido em um momento, mas um processo que, além de permanente, é progressivo, ou seja, a cada dia vamos nos isolando mais do tal paraíso, através da aquisição de novos conhecimentos e da obsessão por mais e mais lucidez.
Essa obsessão é tão forte que aceitamos perder toda e qualquer chance de viver melhor, apenas para continuar aprendendo, descobrindo e “compreendendo” os segredos do universo.

Pois é!

Voltando à nossa Terra Brasilienses, temos um longo caminho pela frente, não há dúvida, mas que esse caminho seja de construção, não de terra arrasada.
Ainda que o nosso paladino esteja fazendo um grande trabalho, se imaginarmos que ele vai se estender até às últimas consequências, ficaremos em situação semelhante à dO Alienista de Machado de Assis, todos iremos para a cadeia.
A limpeza moral do país não pode passar pela extirpação do “mal”, a história está repleta desse tipo de “solução”: a Alemanha nazista, a União Soviética stalinista, a república socialista de Cuba, mais recentemente o Estado Islâmico, Rodrigo Duterte, nas Filipinas, e tantas outras. Nesses momentos ficou muito claro como o “mal” assume novas formas e continua presente e atuante.
Ou nos conformamos (definitivamente) com nossa imperfeição e tentamos promover a evolução a partir dessa realidade ou vamos continuar lotando o inferno com nossas pobres almas “bem intencionadas”.
Nunca se vence uma guerra lutando sozinho
Cê sabe que a gente precisa entrar em contato
Com toda essa força contida e que vive guardada
O eco de suas palavras não repercutem em nada

É sempre mais fácil achar que a culpa é do outro
Evita o aperto de mão de um possível aliado, é...
Convence as paredes do quarto, e dorme tranqüilo
Sabendo no fundo do peito que não era nada daquilo

Coragem, coragem, se o que você quer é aquilo que pensa e faz
Coragem, coragem, eu sei que você pode mais

É sempre mais fácil achar que a culpa é do outro
Evita o aperto de mão de um possível aliado
Convence as paredes do quarto, e dorme tranqüilo
Sabendo no fundo do peito que não era nada daquilo

Coragem, coragem, se o que você quer é aquilo que pensa e faz
Coragem, coragem, eu sei que você pode mais.

Por quem os sinos dobram
Raul Seixas

O Medo é o lobo do homem!

Nossa visão de mundo é determinada, principalmente, pelo medo.
E o principal medo é o de ser parte do problema. A maioria de nós acredita piamente que faz parte da solução, não do problema. Lamento, mas todos nós, sem exceção, somos o problema.
Essa visão angelical do ser humano que rejeita nossa realidade animal e, por isso, obstrui o caminho para uma evolução consciente, paradoxalmente, é necessária, é parte do mistério que só pede “Ser Sagrado”, entretanto o desafio é desvencilharmo-nos do medo e do wishful thinking que distorcem nossa percepção.
O pensamento mágico vai sendo solapado pelo conhecimento, quanto mais conhecimento menos acreditamos em transcendência e, para deixar as coisas um pouco mais confusas, a fé (crenças) faz parte desse pensamento mágico que vamos perdendo e sem a Fé não conseguimos mais construir futuros, nos sentimos cada vez mais à mercê dos elementos.
Se acreditarmos que somos capazes de mudar as coisas e não enfrentarmos o medo das consequências, do mal que estará presente em todos os momentos, nos deixamos guiar pelo wishful thinking, se, por outro lado, nos tornarmos céticos, ainda que realistas, não teremos porque agir, já que não teremos esperança.
Equilibrar tudo isso é o nosso desafio e a única coisa certa é que não podemos nos guiar pelos nossos medos.
É comum, ao discutir política, ouvir argumentações do tipo: as coisas são muito mais complexas, não dá para explicar em palavras, a democracia é difícil, cada um tem a sua visão particular. Todos argumentos válidos, entretanto, utilizados apenas para se esquivar da discussão real, por medo de aceitar que, por mais evoluídas que sejam, as sociedades humanas sempre se reduzirão, em algum momento, a uma sociedade de animais, em outras palavras, a uma selva.
“É preciso sair da zona de conforto”, dizem, mas, contraditoriamente, não abandonam suas crenças confortáveis em um mundo melhor com pessoas mais conscientes e relações mais “justas”, ainda que cada um, dependendo da sua tribo, tenha uma noção diferente de como atingir essa justiça.
Estamos correndo o risco de voltar à era das trevas, basta que alguém ou um grupo defenda uma corrente de pensamento contrária, ou mesmo diferente da nossa, para ser condenado à fogueira!
E as redes sociais servem de validadoras dessas condenações por afinidade.
O verdadeiro paradoxo é que, exatamente essa disposição para criar uma sociedade mais justa, leva a mais injustiça, mais intolerância e mais sectarismo. Isso vale para defensores da direita e da esquerda, espiritualistas e materialistas, indiscriminadamente.
Enquanto o medo dominar nossa visão de mundo vamos sempre ser controlados pelos poucos que assumem a coragem de enfrentar o mundo como ele é, independente de nossos sonhos de transcendência.
Afinal, se todos concordamos que a sociedade humana está doente, que as coisas não vão bem, será necessária uma ação corretiva e não se resolve um problema usando as mesmas premissas que o geraram.
Um mundo melhor, maior consciência individual e uma sociedade mais equilibrada é possível e, eu diria, está acontecendo todo dia, lutar pelo avanço dessas mudanças é fundamental, acreditar que isso pode ser conseguido com divisão, sectarismo e intolerância é pouco produtivo. Isso destrói a confiança que é a única cola que mantém uma sociedade.
Isso quer dizer apenas isso, ou seja, precisamos ter certa capacidade de análise que não seja condicionada por visões maniqueístas da realidade.
Evidentemente, se nossa análise levar à conclusão que esta ou aquela medida ou mesmo o governo como um todo está errado, devemos lutar para mudá-lo, mas, o que vem ocorrendo cada vez com mais frequência são atitudes pouco avaliadas e, principalmente, pouco realistas, muitas vezes baseadas na ideia de “direitos” que devem ser respeitados não importa como: o governo que se vire!
Falo de melhorar a si mesmo, percebendo que nem tudo que parece uma atitude positiva está isenta de algum mal e aprimorando nossa capacidade de perceber o “eu” e o “nós”.
Saltamos, sem rede de proteção, da era das incertezas para o fim da história, o ápice da evolução humana, finalmente a era das respostas finais. É como se a atual geração não tivesse mais dúvidas: aborto, homossexualismo, filosofia, política, família, religião, tudo enfim já está dominado. Claro, cada um com a sua certeza, bradando aos quatro ventos suas convicções, como se os outros estivessem irremediavelmente errados. Exatamente a situação que estávamos na idade média.
O mundo está ficando muito chato!
Chegamos a tal ponto que se pretende banir marchinhas de carnaval, livros didáticos e expressões populares tradicionais por não se adequar a esta ou aquela “verdade insofismável” - tempos de fazer inveja a qualquer Savonarola.
Do mesmo jeito que falar “graças a deus”, “se deus quiser” ou “vai com deus” não quer dizer que eu acredite em algum deus, afinal são expressões de linguagem cuja intenção não tem nada a ver com religião, também posso contar uma piada de judeu e não ser anti-semita ou de bicha e não ser homofóbico.
Isso é olhar só a superfície, acaba sendo tão preconceituoso quanto o que querem policiar. Sentimentos não podem ser aferidos por palavras, o buraco é muito mais embaixo.
Somos cria de uma cultura, cada um da sua, nossos sentimentos estão condicionados por essa cultura, é a razão que nos permite administrar esses sentimentos. Se uma pessoa extremamente estressada está sentada e batendo o calcanhar no chão freneticamente, não é amarrando a sua perna que faremos ela ficar calma.
Precisamos aceitar as diferenças e defender as ideias que achamos mais corretas, deixando um pouco de lado essa obsessão por cobrar dos outros o que nem sempre somos capazes de respeitar.
E, por mais absurdo que possa parecer, o grupo que defende obsessivamente o “politicamente correto”, censurando tudo que não estiver “de acordo” com sua visão, acusa o “outro lado”, políticos ou religiosos radicais, de estar fazendo “censura”!
Não resisto à tentação de ligar esse fenômeno com nossa visão de mundo “comodista”. Escolhemos sempre as opções que levem ao que achamos ser um mundo mais perfeito, o que é entendido como aquele que nos propiciará maior estabilidade e segurança.
Para entender melhor aonde essa confusão está nos levando, basta verificar o discurso mais progressista, hoje em dia, frente à reação que se esboça da direita, dos nacionalismos e da xenofobia. Prega-se a queda das fronteiras, velho sonho da humanidade, o livre acesso de todos aos benefícios da modernidade, a comunhão dos povos, entretanto, para não perder a popularidade, prometem segurança, bem estar social e desenvolvimento econômico, como se todas essas conquistas viessem como bônus por bom comportamento.
Ora, sabemos que não é assim, o mundo integrado dos nossos sonhos custa não só recursos financeiros e humanos, mas provoca, ao menos no primeiro momento, acreditando que a longo prazo possa ser benéfico, insegurança, conflitos e um sem número de dificuldades que têm que ser superadas com esforço e obstinação.
Um mundo totalmente seguro e estável é, além de utópico, necessariamente, muito chato, ou percebemos que é dando chance ao erro que poderemos evoluir ou estaremos fadados a ser escravos de tudo aquilo que “conquistamos”.

Realidade
O que fazer?

Muitos têm falado de leis, constituição, direitos etc., como argumentos pró e contra o processo político em curso, mas algumas normas básicas têm sido esquecidas. No caso: civilidade, bom senso, coerência.
Senão vejamos:
  1. O atual governo foi eleito por nós, quando votamos em Dilma e, mais abrangentemente, no PT.
  2. O imbróglio que levou ao impeachment nasceu das alianças espúrias feitas pela “presidenta” e seu partido, unindo-se ao que havia de pior na política nacional, a saber, o PMDB de Sarney.
  3. A quase unanimidade que levou a aventura do PT no poder a um fim humilhante, foi construída pela própria conduta de seus líderes e instâncias partidárias, que chafurdaram na corrupção com a arrogância dos ignorantes.
  4. Quando pedimos “Fora Temer” estamos, de forma absolutamente equivocada, pedindo para limparem a sujeira que nós mesmos fomos os responsáveis causadores. Além disso, nada temos a acrescentar.
  5. E, por último, mas muito importante, as reformas propostas hoje são as mesmas que o governo anterior alegava que estava tentando implementar e o congresso boicotava.
    Quando digo as mesmas é isso mesmo, as “mesmas”, quem tiver dúvida faça uma comparação.
    "Não é possível que a idade média de aposentadoria das pessoas no país seja de 55 anos", afirmou Dilma na ocasião.
A favor de que estamos lutando?
Dizer que é pela justiça social, contra a corrupção ou outras generalidades do tipo, só atestam a falta de objetividade da luta.
Na verdade estamos apenas esperneando, esperando que algum “bom de bico” nos convença que ele será nosso salvador e, novamente, vamos “dar asas a mais uma cobra”.
Ainda que se conseguisse as tais “diretas já” que muitos estão pedindo - aliás, referência simplesmente ridícula a um movimento legítimo de décadas passadas - mas, se essas tais eleições pudessem ser realizadas, em quem nós votaríamos?
Filho, vivemos num mundo que tem muros. E esses muros têm que ser guardados por homens armados. Quem vai fazer isso? Você? […]
Você não deseja a verdade, porque lá no fundo, num lugar do qual você não fala em festas, você me quer nesse muro. Você precisa de mim nesse muro. Usamos palavras como honra, código, lealdade. Usamos essas palavras como a espinha dorsal de uma vida passada defendendo alguma coisa.
Você usa essas palavras como um slogan. Não tenho tempo nem disposição de me explicar a um homem que acorda e dorme sob o cobertor da liberdade que eu lhe proporciono, e depois questiona a maneira como eu a proporciono.
Eu preferiria que você dissesse “obrigado” e seguisse o seu caminho. Caso contrário, sugiro que você pegue uma arma e assuma um posto.
De qualquer maneira, não dou a mínima para o que você julga ter direito.
Nathan R. Jessup, coronel conservador interpretado por Jack Nicholson,
respondendo ao tenente da marinha liberal, Daniel Kaffee,
interpretado por Tom Cruise, no filme de 1992, Questão de honra.
A visão utópica busca articular metas sociais e conceber políticas para atingi-las diretamente: a desigualdade econômica é atacada em uma guerra contra a pobreza, contra a poluição com regras ambientais, contra o desequilíbrio racial com prioridades, contra os cancerígenos com proibições e aditivos alimentares.
A visão trágica aponta para os motivos egoístas das pessoas que implementariam essas políticas – ou seja, a expansão de seus feudos burocráticos – e para a sua inaptidão para antecipar uma miríade de consequências, especialmente quando as metas sociais contrariam milhões de pessoas que perseguem seus próprios interesses.
Tábula rasa, Steven Pinker, psicólogo de Harvard

Os pratrasmente faroleiam os prafrentemente

A gente percebe que o estado do bem estar social acabou gerando uma cultura da segurança em detrimento da liberdade.
Uma pesquisa recente demonstrou que os mais pobres são contra a PEC dos gastos, a reforma da previdência e das leis trabalhistas, em resumo, querem mais do estado o que significa mais intervenção do estado na vida de todos nós. Isso se compreende para a faixa abaixo da linha de pobreza ou até essa linha, uma vez que estão em um estado de vulnerabilidade tal que, se não tiverem um apoio, não conseguirão sobreviver e, pior, não terão condições de criar seus filhos, mas acima dessa linha deveríamos ter uma outra percepção, a de que precisamos de um ambiente econômico sadio para realizar nossas potencialidades, buscar nossos sonhos ao invés de sobreviver da caridade do estado.
Só aprovam essas medidas os mais favorecidos que, por outro lado, são os que mais influenciam as decisões de governo e acabam por ser formadores de opinião.
Quando olhamos para o mundo vemos a mesma tendência, essa guinada à direita em vários países é um sintoma disso, já que não é voltada para o liberalismo, ao contrário, para o protecionismo e intervencionismo, apenas que aqui me parece ser mais acentuada, fruto da nossa natureza macunaímica.
Interessante analisar esse fenômeno mundial tendendo para a direita nacionalista, xenófoba e populista, da qual Hitler foi o melhor (ou o pior) exemplo, fazendo um paralelo com a nossa guinada.
Analisando de forma muito livre a história recente, vemos que o Brasil andou sincronizado com o mundo embora nem sempre sintonizado.
Quando o mundo todo estava dominado por ditaduras populistas e nacionalistas, antes da 2ª guerra, nós estávamos vivendo o Estado Novo de Getúlio Dornelles Vargas, em total sintonia com esses regimes. Nessa época Inglaterra e Estados Unidos eram a exceção, entretanto conseguiram “convencer” Gegê a juntar-se aos aliados, com direito ao lançamento de estrelas brasileiras em Hollywood, inclusive o Zé Carioca.
Depois, quando a guerra fria exigia o endurecimento dos regimes em países do 3º mundo, para conter o avanço do comunismo que se alastrava como uma febre entre as populações miseráveis dessas regiões, tivemos nossa ditadura militar coordenada pela CIA. Nessa época os países desenvolvidos viviam a explosão do movimento hippie, dos movimentos pacifistas, do amor livre e da apologia das liberdades individuais.
Em 1968 tivemos o movimento estudantil - aqui para contestar a violência da censura e o cerceamento de direitos fundamentais, lá por mais liberdade e uma reforma educacional liberalizante.
Em 1985 tivemos a eleição, ainda que indireta, de Tancredo Neves, o primeiro presidente civil depois de 21 anos. Em 1989 a queda do muro de Berlim.
Em 1992 Clinton, o primeiro democrata depois de 12 anos de domínio republicano, é eleito presidente dos Estados Unidos, aqui o impeachment de Collor.
Em 1994 a África do Sul em festa com a posse de Nelson Mandela, aqui a implantação do Plano Real em meio a um clima de otimismo pela continuidade democrática.
Em 2002, enquanto os Estados Unidos tentam entender o 11 de setembro, vendo o medo dominar a cena, nós elegemos Lula, acreditando que a esperança tinha vencido o medo.
Agora, quando o mundo se inclina para a direita populista e tende a se fechar com mecanismos protecionistas, aqui a opinião pública, influenciada pela elite econômica, pede mais mercado e menos governo, apoiando iniciativas liberalizantes na economia, ainda que o povo continue exigindo mais proteção.
Como analisar essas discrepâncias entre nós e o mundo civilizado?
Fica claro que o terrorismo uniu as opiniões da maioria da população dos países desenvolvidos que, levados pelo medo, pedem mais proteção.
Aqui, felizmente, não fomos atingidos ainda por essa onda e as diferenças se dão por outras causas.

Macunaíma, em busca da muiraquitã, quer matar o gigante Piaimã

Macunaíma se acha ishpérrtu pra caramba e tem uma priguiça tão profunda que acha um saco esse negócio de aprender, melhor comprar feito, afinal já sabe tudo mesmo.
Sendo assim ignoramos o grande avanço que a humanidade experimentou desde o renascimento, quando o homo sapiens tomou consciência da sua ignorância.
Isso explica porque sempre estamos um passo atrás. Estamos sempre esperando pelas respostas prontas, não estamos dispostos a trilhar o caminho tortuoso que os povos desenvolvidos trilharam para inventar e produzir tudo que compõe o seu modo de vida e que cobiçamos obsessivamente.
Somos reativos, não temos índole de pioneiros. Reagimos ao que vemos nos outros e, mais que admiramos, invejamos. Nesse aspecto é notável como desmoralizamos qualquer iniciativa mais arrojada de compatriotas, sempre rotulando de oportunismo ou malandragem qualquer tentativa de ser original ou competitivo.
Só posso comprar algo que alguém trabalhou para produzir, seja esse algo material ou ideal. Correntes de pensamento dominantes no mundo chegam aqui com atraso, devido ao fato de que não reagimos às situações e imaginamos nossas próprias soluções, mas esperamos os outros as adotarem para então ir atrás.
A submissão à cultura americana, por exemplo, é um fenômeno mundial e, claro, aqui entre nós também. Uma pesquisa recente mostrou que, em São Paulo, 38% dos edifícios novos tinham nomes em inglês, enquanto 32% tinham nomes em português.
Nesse caso, de quem é a culpa? Das construtoras, que só colocam esses nomes porque são mais “vendáveis”, ou da própria população, que é seduzida por nomes considerados “chiques”?
Ou seria do império americano, que vem impondo sua cultura aos demais sem pedir licença?
Isso é apenas um dos aspectos dessa auto desconstrução. A admiração pelo nosso grande irmão do norte vai muito além, mas não pelas atitudes que observamos neles, e sim pelo que vendem.
Sem querer entrar na questão dos impérios e como usam a cultura para fins de dominação, temos que admitir que o responsável final por esse fenômeno é a população que se deixa seduzir. Motivos para isso os há de sobra, mas ainda assim não se pode dizer que as pessoas não têm opção.
Quando nos deparamos com um serial killer não temos dúvida de que ele deve ser responsabilizado por suas atrocidades, entretanto, se analisarmos mais a fundo a história dessa pessoa, com certeza vamos encontrar razões mais do que suficientes para justificar sua violência: maus tratos na infância, pais violentos, abusos dentro de sua própria casa etc. etc., entretanto isso não basta para o perdoarmos, apenas podemos entender o que o levou a essa situação e, eventualmente, quando possível, atuar para que aquelas condições não se repitam com outras crianças.
O estado de guerra em que o tráfico de drogas nos colocou, em última análise, só existe porque existe o consumo, aliás, fato muito bem traduzido no filme Tropa de Elite.
Como já disse o Gabeira: Não existem pragas, apenas insetos com fome!
Da mesma forma, guardadas as devidas proporções, não podemos ceder a demandas de uma população que, ainda que carente, habituou-se a esperar muito do estado e se dedicar pouco à conquista de sua liberdade, sendo facilmente seduzida, seja por populistas, de direita ou de esquerda, seja pela TV e as culturas alienígenas que ali dominam.
Sabemos os motivos que levaram a essa situação, mas isso não muda o fato de que esse povo não está preparado para enfrentar sozinho os desafios do seu próprio desenvolvimento. Não se trata de ignorar as carências de parcelas significativas da população, ao contrário, o que é necessário é adotar as políticas corretas e não as que a massa desinformada tende a exigir. Alguns exemplos dessa situação estão captadas neste site, lembrando que isso vale para direita, esquerda, centro e abstenções.
Precisamos de políticas que, muito além de ajudar na manutenção da vida dessas pessoas, promovam a recuperação da sua dignidade, da vontade de lutar, de buscar sua realização. Ainda que a ajuda direta seja necessária abaixo de certas condições, a grande maioria está sendo induzida a ficar viciada em caridade, quase que abdicando de sua capacidade de reação.
Aqui não estou falando de regras e condições apenas, mas de estímulo, algo que faça com que esse povo se sinta verdadeiramente entusiasmado a fazer a diferença. Precisamos de um projeto nacional que nos dê esse ânimo.
Precisamos construir uma juventude que seja refratária a receber ajuda, seja dos pais, seja do governo. Que se tornem pessoas que, mesmo em condições adversas, prefiram se arriscar em algo de sua iniciativa do que se submeter, seja a um pai, seja a um bolsa família, seja a um chefe de facção.
Em outras palavras: precisamos privilegiar o gosto pela liberdade em nossos programas assistenciais, mostrando que não há, porque não há mesmo, alternativa segura.
Essa necessidade não é de uma parte da sociedade que, ciosa de seus bens ou rendas, quer se proteger a qualquer custo, mas de toda a sociedade. Os da base da pirâmide, para que consigam meios próprios para se manter, e os do topo, porque nunca haverá paz e harmonia onde houver “insetos com fome”.
O pior é que aqueles que assumem uma postura de defensores dos pobres são os que mais afundam esses mesmos pobres em uma vida de dependência e submissão, primeiro porque estamos contaminados de tal forma com essa fantasia de estado do bem estar social que não sabemos mais que a vida é risco e que só tem graça se tiver risco e segundo porque carregamos um imenso sentimento de culpa por termos mais entre os que têm menos e não termos coragem de dividir, porque sabemos que não podemos confiar neles, pelo menos não a ponto de convivermos com eles sob o mesmo teto.
Eles é que são assim e devem superar essa condição por seus próprios meios. Evitar que as crianças de agora sejam submetidas aos mesmos condicionantes que criaram esse problema passa exatamente por aí, que não se deixe impune essa atitude passiva.
Algumas religiões, enfaticamente voltadas à segurança, foram criadas exatamente para retirar a capacidade de se libertar do ser humano. Mesmo quando um líder religioso incita seu povo a se rebelar é só para renovar a liderança, porque o povo uma vez submetido buscará sempre o refúgio de uma liderança forte.
Por isso só acredito no anarquismo,  desde adolescente. É uma utopia, mas pelo menos “eu sei” que é uma utopia.

Cabeça de mundo perfeito

As crenças estapafúrdias que o ser humano é capaz de desenvolver são sempre fruto do medo, aquele medo não confessado, mas que só se dissipa quando o sujeito se sente sob a “proteção” do objeto de sua fé.
Como não canso de dizer, para mim Fé, assim com letra maiúscula, é um substantivo, ou seja, é uma força que move a vida, que gera o entusiasmo e não requer nenhum objeto de fé, a Fé é o próprio objeto.
Fé em “algo” não é Fé, é crença.
Esse tipo de fé, ou crença, normalmente não tem nenhum fundamento, ainda que os seus seguidores argumentem que está tudo em algum livro ou testemunho. Se fosse fácil assim, eu poderia admitir que a “sociedade alternativa”, onde poderei fazer o que eu quiser porque será tudo da lei, é uma “verdade” que foi proclamada pelo profeta Raul. Por quê certos livros e testemunhos são melhores que outros?
Mas, que medo é esse? Medo de que a vida seja só isso?
Só isso? A vida é uma experiência de infinitas possibilidades e, ainda que muitos tenham dúvida e outros possam até discordar, foi uma opção de cada ser vivente. Nós quisemos viver, por isso vivemos, nossa curiosidade nos trouxe até aqui.
O medo de enfrentar nossas próprias escolhas leva a acreditar em:
  1. Um mundo perfeito após a vida;
  2. Um mundo perfeito no futuro.
Sobre o número 1 acho que já falei bastante, admito que cada um acredite no que quiser, apenas gostaria de um pouco mais de racionalidade sobre essas crenças, mas sobre o número 2 vale algumas observações.
Ainda que se possa achar que acreditar na possibilidade de um mundo perfeito seja uma forma de pensamento positivo, já que poderia (ou deveria) induzir a uma atitude pró-ativa na construção desse mundo melhor, o que se constata é que acaba por ser uma tautologia, só um mundo povoado por pessoas perfeitas resultaria em um mundo perfeito.
A nossa realidade é um pouco diferente e os humanos reais, ao aspirar pela perfeição, passam a gostar cada vez menos da experiência do aqui e agora, tornando-se cada vez mais intolerantes, impacientes e absurdamente convencidos de que só “nós”, ou seja “eu” mais um pequeno grupo que eu acho que compartilha dos meus ideais, é que estamos nos esforçando na construção do paraíso e que, se não estamos conseguindo, é porque, apesar das soluções geniais que propomos, dos sistemas políticos perfeitos que idealizamos e das fórmulas ideais para o relacionamento em sociedade que sugerimos, “a grande maioria não colabora”.
O futuro perfeito é como a amante, sempre fresca, cheirosa e disponível. Quando comparado com o presente, a esposa cansada no fim do dia de trabalho ou desgrenhada ao acordar pela manhã, é sempre muito melhor.
Sempre que ele vai se tornando presente é como a amante que vai se tornando esposa, acaba por perder aquela atração fatal.
Para piorar, quando a sociedade humana vive longos períodos de paz e harmonia, os indivíduos vão, paulatinamente, perdendo a noção de como foi difícil construir aquele estado de coisas, quantas coisas esses mesmos indivíduos tiveram que abrir mão para o bem do grupo e, sem se dar conta, vão permitindo a deterioração daquela estrutura harmoniosa e, de quando em quando, chegam a provocar revoluções e guerras sangrentas.
Vivemos uma síndrome de herdeiros, não sabemos mais como é difícil construir a estabilidade.
É como eu sempre digo, a perfeição é uma mer...ta, não é para ser alcançada, só perseguida.
Dois exemplos para ilustrar:
Primeiro uma atitude que demonstra como estamos ávidos por “perceber imperfeições no mundo”: Ao assistir a TV, notícias de calamidades são o que mais nos atrai, vamos construindo uma visão do nosso mundo, aquele em que moro, trabalho, passeio, em que vivo a vida real, baseada nessas calamidades.
Ao me levantar do sofá e ir para o trabalho, só percebo o congestionamento ou o mau humor do motorista do ônibus, ou o atraso do Metrô, ou a ameaça dos motoristas irresponsáveis.
Ao passear na praça só percebo “aquelas” pessoas suspeitas rondando por perto ou, se não houver ninguém, as sombras e perigos de andar em um lugar ermo.
Ao encontrar um vizinho o vejo quase como um inimigo, uma pessoa que não merece a minha confiança.
Se aquele “congestionamento” não alterar quase nada o tempo de minha viagem, se o motorista do ônibus me cumprimentar educadamente, ou se aquele carro abrir passagem segura para minha bike, ou se as árvores da praça estiverem floridas e as crianças estiverem brincando alegremente, ou se meu vizinho estiver disposto a uma nova amizade, simplesmente não estarei disponível a essas percepções.
Pode ser que, na realidade, eu viva muito bem, usufrua de minha cidade confortavelmente, entretanto, a partir da minha visão “catastrófica”, acho que tenho que me mudar para um lugar onde se possa “viver bem”. Ora, eu vivo na minha cidade ou na TV?
Outro exemplo de como nossa percepção viciada induz a ideias erradas:
A opção de liberar as drogas é vista com muito receio, pois julga-se que isso não eliminaria o traficante, já que ele sempre vai querer fugir das regulações e impostos, além disso exporíamos a população ao consumo desenfreado. Pensamos em alternativas “tudo ou nada”, ou acabamos com o tráfico e o consumo de drogas ou não há solução.
O fato é que a proibição não reduziu o consumo. Temos que admitir que a droga é uma necessidade da sociedade, assim como o cigarro e as bebidas. Voltando ao Gabeira: Não existem pragas, apenas insetos com fome!
Se disponibilizássemos a droga oficialmente, com campanhas de esclarecimento adequadas, o consumidor seria mais consciente e menos refém dos traficantes, já que não iria querer se arriscar em uma ação que além de ilegal seria menos garantida do que a operação legalizada. Isso acabaria tornando o tráfico muitíssimo menor, no mesmo nível dos de cigarros e bebidas. Nada perfeito, mas, definitivamente, humano!

O eterno retorno

Porquê a vida é um eterno déjà vu para os maiores de 60!
Ouvir as mesmas frases de efeito década após década:
Essa dívida já foi paga mil vezes!
Os juros é que estão sufocando o país!
A tecnologia vai acabar com os empregos!
Os sindicatos são um bando de baderneiros!
A esquerda precisa ser extirpada da política!
Os exploradores do proletariado precisam ser submetidos ao estado popular!
Perguntas que emergem dessa discussão:
Por que assassinaram Trotsky?
Por que Getúlio suicidou-se?
Por que o Zé Dirceu sequestrou o PT?
São perguntas que, se respondidas de bate-pronto, suscitarão mais do mesmo, ou seja, levarão a mais conflitos e nenhuma solução.
Para responder às perguntas acima temos que responder antes:
Por que temos raiva da direita?
Por que temos raiva da esquerda?
Por que temos tanta certeza de estar certos?
e ainda:
Por que ficamos tão excitados ao falar de nossos ideais?
Por que o assunto política nos inflama e faz querer lutar por nossas ideias?
A resposta das três primeiras está nas duas últimas.
As primeiras mostram que esses fatos só poderiam ser evitados se houvesse tolerância, paciência, submissão ao estado de consciência da maioria, sentimento de acolhimento e de que a evolução só é possível em coletividade.
As duas últimas demonstram que nossa necessidade de nos impor de imediato, são motivadas pela visão de que é necessário acabar com o sofrimento já, independentemente das condições objetivas para as mudanças, não objetivamos a evolução mas a revolução, eliminando qualquer chance de “ouvir” o outro lado.
Resumindo, se estivéssemos lá teríamos feito tudo de forma muito parecida.
Se Trotsky tivesse vencido a disputa com Stalin, o conheceríamos como o responsável pela mão de ferro da União Soviética.
Se Getúlio não tivesse se suicidado, lembraríamos dele como mais uma ditadura sanguinária.
Se Hélio Bicudo tivesse vencido Zé Dirceu, teria sido o chefe do mensalão, do petrolão etc.
Alguém poderá dizer que esses personagens, por seu caráter, nunca se prestariam a esses papéis. Pois bem, esse é o motivo pelo qual não o fizeram e a história foi como foi.
Mas, o mais importante é que seria dessa forma não porque as forças contrárias teriam subjugado esses personagens. Não! Esses personagens é que estariam vulneráveis à mudança, pelo imediatismo e individualismo.
O imediatismo e, principalmente, o individualismo fazem com que, mesmo ao almejar um objetivo nobre como o fim da pobreza, por exemplo, alguém tente impor suas ideias e chegar ao que considere suas metas o mais rápido possível e a qualquer custo. É a vaidade assumindo o controle.
O que falta a alguns é a humildade de saber que somos apenas peças de um sistema tão complexo que nunca poderemos ter uma visão completa do mesmo, que evolução só pode ocorrer coletivamente. Que não existe certo ou errado em política, apenas o possível.
O ser humano não admite ser tão maligno, então inventa toda sorte de teorias conspiratórias para lançar no "outro" a responsabilidade pelos males do mundo.
O mais irônico é o fato de que a sua malignidade vem exatamente do fato de não admitir esse potencial. Alguém que se reconheça potencialmente “mau” pode, consciente disso, administrar melhor seus sentimentos.
O que impera, infelizmente, é muita vaidade, presunção, arrogância e, pior, adolescência.
Não só promover o debate de ideias, mas participar das discussões que nos propuserem, evitando a armadilha açucarada dos grupos com visões de mundo uniformes, aprender a ouvir mais do que falar (ok, eu estou me incluindo aqui!!!) e abandonar convicções, as vias mais rápidas para assassinar Trotsky.
Mea culpa - sempre digo que estes ensaios servem mais para mim do que para qualquer um, isso se servem para alguma coisa, porque a maior parte dos comentários que faço tem muito a ver com a minha forma de agir, intempestiva, veemente e nem sempre com a disposição para ouvir que, não tenho dúvida, é essencial para um debate de ideias saudável. Claro que é só no calor do momento, nada que signifique mais do que é: rompantes de um passional, mas que admito não deveriam ocorrer. É mais um aspecto do “mal” se fazendo presente.
Acho que só a idade permite ver essas questões com alguma clareza e, eu gostaria, mais calmamente. Me lembro muito bem de minhas longas conversas com o Vôdemar. Eu na defesa intransigente do PT e de Lula e ele, de forma muito tolerante, dizendo que alguma coisa na figura do Lula lembrava Stalin.
Outro velho: Mr.Bridier, francês com quem trabalhei o ano de 78 inteiro (ou teria sido 79, 77? - não tenho mais certeza). Ele me dizia com muita calma: - Vocês (os brasileiros) estão cometendo um grave erro: queimar etapas!
D a r   c h a n c e   a o   e r r o
porque o medo pede coragem, não covardia
Já sei! Mais uma vez vão dizer que estou sendo muito agressivo, que eu sou muito radical, alguns até dirão que é um estilo que não ajuda nada na argumentação porque gera muita resistência.
Pode ser! O que não posso é fazer de outra forma pois não seria eu mesmo.
Prefiro dar uma chance ao erro e arriscar até ser mal interpretado, mas sendo honesto comigo e com quem estiver lendo. Na verdade, venho abordando esses temas desde o Vol. I, de 2010.
Muitos se lembrarão que insisto sempre, o medo é nosso maior inimigo - se não for o único?!
Quero descrever três atitudes que, definitivamente, não são as mais efetivas no enfrentamento do medo que, inevitavelmente, nos cercam a vida toda.
A primeira é a de quem se entrega aos seus sentimentos como se isso fosse sinônimo de viver plenamente. Acham que estão no controle de suas vidas e que vão atrás de certas coisas porque “gostam”.
Esses são os mais facilmente controlados pelos interesses dos poderosos, pois não percebem que, se gostam tanto de certos itens de consumo ou de certo estilo de música ou de bem cultural - as novelas são um excelente exemplo - na verdade “dançam conforme a música” regida pela sociedade de consumo.
Evitam arriscar fora do seu pequeno mundo pré-fabricado e experimentar coisas novas que, é claro, sempre poderão dar errado.
A segunda é daqueles que, convictos de que percebem mais claramente do que todos os demais, rotulam o mundo a sua volta com etiquetas de “bom” e “mau”: televisão é “mau”, leitura é “bom”, fast food é “mau”, comida “vegana” é “bom.
Perdem com isso a capacidade de perceber o mundo como ele é de fato, deixando de lado pelo menos metade da informação.
Usam rótulos como “imprensa fascista” ou “corporações manipuladoras” indiscriminadamente, como se os processos conduzidos por essas instituições fossem simples conspirações contra o ser humano comum.
Não se permitem avaliar mais detalhadamente as mudanças que estão ocorrendo constantemente e continuam em sua busca da perfeição perdida, com isso praticam intolerância, sectarismo e colaboram para a destruição do pouco que resta de confiança na sociedade. Esses são os mais perniciosos pois parecem corajosos e induzem muitos do seu círculo a adotarem a mesma atitude.
Por medo de parecer “conservadores”, não se permitem uma opinião “conforme”. Continuar sendo “do contra”, haja o que houver, parece ser mais “heróico” e aceito pelo seu grupo.
A terceira é a daqueles que tentam evitar que seus filhos corram qualquer tipo de risco, cercando-os de toda proteção possível.
Ainda que exista um limite razoável para a liberdade de uma criança, é só com os erros, os acidentes e as consequências desses atos que a criança vai aprender.
Claro que não vamos agir como o papai “peixe” que, ao ver seu filho indo em direção a um anzol, diz para a mamãe “peixa”: Deixe, ele tem que aprender com sua própria experiência. Mas, por outro lado, excesso de proteção atrapalha.
Se a criança não cair da bicicleta algumas vezes, não vai consolidar a técnica, se não engolir água tentando nadar, não vai perder o medo e não vai construir a noção do risco que aquela atividade representa, correndo muito mais risco que aquelas que não foram tão “protegidas”.
Enfim, o medo tem que ser enfrentado com coragem, coragem de dar chance ao erro, permitir que “o aprendizado entre pelos dedos”, como dizia o velho marceneiro, porque aprendizado exige experiência, experiência envolve erros e sem aprendizado não há vida. E a coragem maior tem que ser dos pais, evitando super proteger seus filhos.



Um presente pra você (clique)
Preocupação e Arrependimento
Um romance que Jane Austen não escreveu
Mr. Darcy observava Emma à distância. O baile no palácio dos de Bourgh reunia grande parte da nobreza, mas, para o ansioso mancebo era como se houvesse uma única dama no salão.
Me sinto tão atraído por ela, mas... Não sei se nos daríamos tão bem como um casal, me preocupa sobremaneira sua atitude decidida.
Emma, em seu último encontro, deixara claro que não veria mais Mr. Darcy se ele não propusesse o compromisso a seu pai, lorde de Bourgh.
A preocupação dominou os pensamentos do rapaz de tal forma que a noite se foi, todos se recolheram a suas residências, apenas Mr. Darcy parou na taverna. Encontrou no whisky um lenitivo para suas aflições.
Uma semana depois do baile, Mr. Darcy toma conhecimento do recém anunciado noivado de Miss Emma com Sir Thomas Bertran, viúvo e bem mais velho, mas que ela havia aceitado como afronta ao rapaz, pela sua indecisão.
Mr. Darcy não se conforma. Naquele momento do baile, um verdadeiro presente que havia recusado por medo do que o futuro pudesse lhe reservar, ele havia lançado a si mesmo e à adorável Emma a um futuro de frustração e tristeza.
Desde então até o fatídico enlace, o outrora garboso Mr. Darcy se consome dia após dia em um sofrimento sem fim.
Desta feita, é o arrependimento por esse momento passado que leva Mr. Darcy ao encontro do seu fiel companheiro etílico, no qual o presente era sempre sublimado entre preocupação e arrependimento.