Compromisso? O que é isso?
Uma mensagem de Ano Novo
29/12/2016
Nesta época do ano costuma-se falar muito em compromisso. Tudo aquilo que nos dispomos a fazer no próximo ano - algumas coisas são sempre para o próximo ano.
O fato é que, apesar desse conceito parecer uma coisa intuitiva para nós, não é tão claro assim para a maioria do nosso povo.
Os eventos pelos quais o Brasil vem passando ao longo de sua história parecem desconexos ou obra do acaso, das correntes políticas e do jogo de forças em nossa sociedade. Claro que tudo isso é parcialmente verdade, entretanto, como em qualquer ecossistema, esses fenômenos são todos interligados por uma lógica inexorável: a evolução.
Como já discutimos em muitas outras ocasiões, não podemos negar que a evolução humana é um fato, ainda que consideremos lenta - o sofrimento hoje é muito menor do que era há 4 séculos e menor ainda do que era há 20 séculos.
Esse processo subsiste a tudo que a gente faz, por mais complexos que sejam os acordos que criamos nas sociedades e independe da formatação desses acordos. É aquela velha ideia de que qualquer sistema dará certo onde as consciências forem bem desenvolvidas.
Em nosso caso, analisando o desempenho econômico do país, tivemos várias fases de aparente progresso seguidas de fases de recessão.

Compromisso, o que é isso? Lincoln Harten

Segundo Marcos Mendes (Por que o Brasil cresce pouco?), os motivos que levam à estagnação econômica são:
1. crescimento do gasto público corrente;
2. crescimento da carga tributária;
3. baixa poupança;
4. elevada taxa de juros;
5. gargalos de infraestrutura;
6. crescimento do salário mínimo acima do aumento da produtividade do trabalho;
7. fechamento da economia ao comércio internacional;
8. incerteza jurídica e fraca proteção aos direitos de propriedade;
9. proliferação de empresas pequenas e informais;
10. baixo desempenho da educação, em especial da pública.
Esses são os fatores indicados pela teoria econômica para frear o crescimento em regimes capitalistas e democráticos.
Confrontando com os momentos da nossa história que citei em “Eu fui do contra II”, percebe-se uma relação direta com os itens descritos acima.
Pelo lado sociológico, o que provoca essa estagnação é a desigualdade entre ricos e pobres em cada sociedade (segundo o mesmo autor).
As pressões da sociedade, normalmente, não são por maior igualdade, mas por mais direitos, e provocam, de tempos em tempos, uma fase distributiva, com aumento real do salário mínimo, programas de complementação de renda, aumento dos programas assistenciais, mas também por mais privilégios aos empresários, protecionismo etc. Isso vem desde os tempos do império, com a abolição dos escravos e outras iniciativas visando os menos favorecidos, ao mesmo tempo que se preservavam os privilégios dos mais abastados.
Ciclicamente, após esses movimentos sobrevém uma crise econômica, com as inevitáveis crises políticas e institucionais decorrentes (é sempre pelo bolso que tudo se inicia). Entretanto, finda essa fase, o crescimento é retomado a partir de um patamar de desigualdade um pouco menor do que o anterior, porque os eleitores acabam sendo, em fases de prosperidade, mais sensíveis às demandas das classes mais pobres e aderem com facilidade a campanhas como o “Fome zero”, “Bolsa Família”, “Minha Casa, minha Vida”, para citar os mais recentes, ainda que isso tenha um custo social alto, já que não há, de fato, uma distribuição efetiva, mas sim uma distribuição dissipativa, em que o próprio beneficiado acaba pagando parte da conta por meio da carga tributária e da crise que esse excesso de gastos provoca.


Aqui eu quero fazer um comentário sobre educação, saúde e previdência, porque são temas que demonstram como uma análise superficial do problema pode levar a conclusões imprecisas.
É comum se dizer que a educação pública “do nosso tempo” era muito melhor que a de hoje, eu mesmo vivo repetindo isso, entretanto, quando verificamos os dados estatísticos, vemos que a quantidade de alunos atendidos por aquela escola de melhor qualidade era muito menor do que a quantidade atendida hoje, em números absolutos e em percentual da população.
Nos velhos e bons (?!) tempos haviam algumas ilhas de prosperidade no país e quem estivesse nelas usufruía de serviços públicos até bem razoáveis, mas 90% da população não tinha acesso a qualquer serviço público.
A partir da constituição de 1988, que universalizou o acesso a esses serviços, e da estabilização da economia obtida com o plano Real, entre outras medidas, foi possível ao governo Lula tornar real o que a constituição prometia.
Isso é verdade também para a saúde e a previdência, permitindo inclusive que um contingente gigantesco de trabalhadores rurais, que nunca tinham efetuado nenhuma contribuição ao sistema previdenciário, pudessem contar com a sua aposentadoria.
O fato é que, ainda que a qualidade deixe muito a desejar, os gastos, só com esses três itens, se multiplicaram espetacularmente e, queiramos ou não, permitiu que uma população enorme passasse a ter acesso a esses serviços.

Distribuição de renda

Quando se exige "direitos" do estado, normalmente ignora-se a forma como esses recursos serão gerados ou são propostas alternativas do tipo intervenção do estado na economia, moratórias, expropriações etc.
Ao estudar o funcionamento de uma economia capitalista democrática e quais os mecanismos de enriquecimento de uma sociedade, verifica-se que só a liberdade de ação dos agentes produtivos pode propiciar esse crescimento.
A postura reivindicativa dessa corrente de pensamento quer retirar recursos a força do que se costuma chamar de elites e, assim fazendo, agem como o fazendeiro irresponsável, que tira tudo que pode da terra sem conservá-la e acaba falindo.
A economia de mercado é um ecossistema, dessa forma só com o mínimo de interferência pode-se atingir algum equilíbrio. Toda regulamentação tem que ser muito bem negociada e, principalmente, passar aos agentes econômicos a segurança de que haverá manutenção das regras do jogo e a segurança jurídica necessária para estabelecer um ambiente de competição saudável.

Compromisso? O que é isso?

É uma viagem, a bordo da Confiança, rumo à Esperança!
Confiança é a cola que une uma sociedade. Sobre isso tenho dois “causos” que acho que já contei, mas como vem muito bem ao caso, conto de novo.
Quando o Marcelo e o Filipe eram ainda bem pequenos, tínhamos uma auxiliar chamada Cida que ajudava nas tarefas domésticas e também para cuidar das crianças. Ela vinha, já há algum tempo, falando que o marido (seu Zé, como ela mesma dizia) não queria que ela trabalhasse mais, mas que ela não queria parar, que precisavam do dinheiro e coisa e loisa.
Era uma pessoa ótima, fazia suas tarefas muito bem, era muito boazinha com os meninos, aplicada nas tarefas e honesta.
Nessa época a Clélia não estava trabalhando, por conta dos filhos. Ocorre que ela foi chamada para retomar suas atividades e como estava animada a voltar a trabalhar - e o dinheiro seria muito bem-vindo - estava muito inclinada a aceitar o convite.
A primeira coisa a fazer era conversar com a Cida, o que ela fez. Perguntou quais eram os planos dela, se pretendia continuar, explicando que iria voltar a trabalhar e precisava que ela continuasse cuidando das crianças.
A Cida se prontificou de imediato e nos disse que estava decidida, que tinha conversado com o marido e estava tudo bem, além disso ela gostava muito de trabalhar em casa, disse que éramos muito bons com ela etc. etc.
Dito isto, a Clélia se comprometeu com o novo serviço.
Na semana seguinte, poucos dias antes da Clélia iniciar no novo emprego, a Cida vem e diz, sem nenhum pejo, que não ia trabalhar mais porque o “seu Zé” tinha arrumado um emprego (até então ele vivia de bicos) e, dessa forma, não queria que ela trabalhasse fora.
Imaginem o transtorno que isso causou. O mais impressionante é que ela não achava que estava fazendo nada de errado, na visão dela estava apenas “se defendendo” como se costuma dizer. Na visão estreita dela, bastava a Clélia fazer o mesmo e dizer ao seu ex-futuro empregador que não poderia ir e pronto, tudo resolvido.
Ela não tinha a dimensão do compromisso, da palavra dada, de honra, isso tudo se diluía na luta diária pela sobrevivência.
Hoje temos outra auxiliar, a Marlene, muito diferente da Cida, é uma pessoa que abre mão de qualquer coisa em função da palavra empenhada, com quem você pode contar a qualquer momento e que fala claramente o que está pensando. Da mesma forma o Obaldino, nosso “faz-tudo” de plantão, outra pessoa com uma noção muito bem desenvolvida de compromisso.
A diferença: a Cida vivia em condições muito precárias, ela e seu Zé eram analfabetos, já a Marlene está fazendo curso de informática, o marido tem uma empresa de serviços de construção, eles tem automóvel, computador etc. A educação e a integração a um estrato social mais desenvolvido faz com que o indivíduo cresça como cidadão.
Outro causo é de quando comecei a usar o aplicativo de táxis, foi logo no início desse serviço - acho que foi a primeira vez que usei.
Eu estava na Av. Enéas de Aguiar à tarde, hora do rush, e precisava pegar um táxi. Normalmente ali sempre tem vários táxis parados, mas naquele dia não tinha nenhum.
Fui até a Rebouças para ver se passava algum e nada. Decidi então chamar pelo aplicativo.
Rapidamente um taxista me respondeu, dizendo que estava na Teodoro, com muito trânsito e que ia demorar um pouco. Eu concordei e fiquei esperando.
Depois que ele me respondeu, passaram uns dois ou três táxis vazios e eu fiquei muito tentado a pegar um deles, mas pensei: – Puxa! O cara está se esfalfando para chegar aqui, não posso dar esse cano.
Quando ele chegou, vários minutos e táxis depois, eu comentei o ocorrido e ele me disse: – Pois é. De lá até aqui muitos passageiros fizeram sinal, mas eu não podia atender já que tinha me comprometido com o senhor.
Esses dois “causos” são um exemplo de como, quando os compromissos passam a ser mais respeitados, cresce a esperança de que as relações sejam mais produtivas e se estabelece um ciclo virtuoso de mais compromissos, mais confiança e mais esperança.
A esperança é o que, ao final das contas, move a economia e ela só surge depois que se estabelece a confiança.
A sociedade não é esgarçada porque as pessoas são más, apenas porque não tem a devida percepção dessa relação. É como se pensassem: – A sociedade já estava aí quando eu nasci, eu não tenho nada a ver com isso.
Isso é perceber que o potencial de “malignidade” está em cada um de nós, não de forma consciente, mas disfarçado em nossas ações mais triviais e nas pessoas mais boazinhas e bem intencionadas. É exatamente por esse motivo que cidadania exige esforço, não basta não “fazer nada de mal”, temos que avaliar nossas ações de uma perspectiva desindividualizada e isso só é possível assumindo e honrando cada vez mais compromissos.
À medida que reduzimos a desigualdade, mais pessoas entram em um círculo de relações interpessoais e com as instituições, que exigem cada vez mais compromissos e aumentam a percepção de que honrar esses compromissos compensa.
Do outro lado, dos abastados e bem informados, ocorre um aumento da pressão, porque estes se acham, de fato, “espertos”, se aproveitando de suas posições privilegiadas para levar vantagem. Entretanto, sofrem cada vez mais pressão das camadas inferiores que começam a questionar os privilégios, percebendo que estes não são bons para a sociedade como um todo, seja para auxiliar os menos favorecidos, seja para beneficiar os mais ricos.
Todo esforço distributivo: complementação de renda, universalização da assistência à saúde, da educação e da previdência social, custa caro e como a produtividade ainda é baixa, pelos 10 motivos apresentados no início, ocorrem as crises.
Sobrevém então um ciclo de arrocho das contas públicas, para colocar as finanças sob controle. Isso melhora os índices de confiança dos empreendedores e há um ciclo de crescimento econômico.

Novamente, ajustadas as contas, as pressões por ascensão social das camadas mais baixas determinam novo ciclo distributivo, provocando o chamado crescimento em “dente de serra”, crescimento seguido de depressão, sucessivamente, mas sempre mantendo um resíduo positivo, de tal forma que a serra é inclinada para cima.
A boa notícia é que isso vem ocorrendo, devagar e sempre, como uma força natural, inexorável. A evolução também é uma força da natureza.
O que pode retardar esse processo são as certezas inabaláveis que, quando em vez, assolam um país, como dogmas religiosos ou filosofias políticas radicais. Graças a deus somos um povo que relativiza tudo, inclusive nossos deuses, radicalismos aqui não sobrevivem e, apesar de termos começado, lá em 1500, com o pé esquerdo, vamos evoluindo, aos poucos mas vamos.
Nossa competitividade em relação ao mundo, hoje, só é garantida pelas dimensões em território e população, condições favoráveis para produção agrícola e unidade cultural, principalmente em relação à língua. Isso não é muito quando observamos a ineficiência de nossa economia e as condições de vida da maior parte da população, mas é o suficiente para manter nosso país íntegro por um bom tempo.

Sonhar com soberania e independência em relação às grandes potências, atualmente, é só isso, sonhar. Nosso desafio é reduzir a desigualdade e fortalecer nossos meios de produção, criando as condições para consolidar a confiança e a esperança que sustentarão o crescimento, daí veremos.



É preciso ter clareza de que,  em relação à escolha de políticas públicas,  nós somos o último ponto do vértice superior da pirâmide, temos muitas vezes mais preparo e informação do que a imensa maioria da população e somos os únicos responsáveis pela análise consciente dos fatos para tomar decisões ou apoiar as políticas mais consistentes para o país.
É, no mínimo, irrefletido, confundir-se com a maioria ignorante e desfavorecida, cuja única razão é a necessidade. Cabe portanto a nós a responsabilidade de escolher as melhores práticas para atingir o crescimento e a redução das desigualdades.


Eu Fui do contra II
16/12/2016
Muita saúva e pouca saúde, os problemas do Brasil são!

Macunaíma

"Quando se tem oportunidade de furtar R$ 0,50 (cinquenta centavos), tirando fotocópia pessoal na máquina Xerox do trabalho, não se perde a oportunidade.
Quando se tem oportunidade de furtar R$ 5,00 (cinco reais), levando para casa a caneta da empresa, não se perde a oportunidade.
Quando se tem a oportunidade de furtar R$ 25,00 (vinte e cinco reais), pegando uma nota mais alta, na hora do almoço, para a empresa reembolsar, não se perde a oportunidade.
Quando se tem a oportunidade de roubar R$ 30,00 (trinta reais) de um artista, comprando um DVD pirata, não se perde oportunidade.
Quando se tem a oportunidade de furtar R$ 250,00 (duzentos e cinquenta), comprando uma antena desbloqueada que pega o sinal de satélite de todas as TV’s a cabo, não se perde a oportunidade.
Quando se tem a oportunidade de furtar R$ 469,99 da Microsoft, baixando um Windows crackeado num site ilegal, não se perde a oportunidade.
Quando se tem a oportunidade de furtar R$ 2.000,00 (dois mil reais), escondendo um defeito do seu carro na hora de vendê-lo, enganando o comprador, não se perde a oportunidade.  
Muitos  não  perdem  nenhuma oportunidade: devolvem a carteira mas furtam o dinheiro, sonegam imposto de renda, dão endereço falso para adquirir benefícios que não tem direito etc etc etc...
Bom, se você trabalhasse no Governo, e caísse no seu colo a oportunidade de roubar R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), com certeza, se você não perde uma oportunidade, iria aproveitar mais esta oportunidade. Tudo é uma questão de acesso e oportunidade.
O povo brasileiro precisa entender que o problema do Brasil não é só a meia dúzia de políticos no poder lá em cima, pois eles, são apenas o reflexo dos quase 200 milhões de oportunistas aqui embaixo.   Os  políticos  de  hoje foram ontem oportunistas e, se não mudarmos a estrutura de valores de nossa sociedade e trazer a Ética e a Moral como pilares do comportamento, nunca seremos um povo realmente honesto e justo!”
Sérgio Moro

Quando disse que deixei de ser do contra acrescentei: e não posso ser mais a favor.
Ao comentar sobre a carência de lideranças mencionei sobre minhas reservas a personalidades como o juiz Joaquim Barbosa, agora faço meus reparos ao discurso do juiz Sérgio Moro, sobre a corrupção ser o principal problema do país.
É quase inevitável buscarmos uma razão única para nossos males, entretanto a realidade costuma ser muito mais complexa. Uma análise um pouco mais detida geralmente mostra que a origem do que nos incomoda está em nós mesmos.
É sempre bom lembrar que, se isso vale para nós, vale também para os outros, que pretendemos ajudar com nossas ideias mirabolantes.
Essa tese, do meritíssimo juiz, é muito verdadeira, mas longe de ser a essência de nossos problemas.
A corrupção é um mal hediondo, sem dúvida, e eu nunca imaginei, depois de ter combatido Ademar de Barros, Paulo Maluf, Quércia, Collor e tantos outros, que chegaria a compactuar, como cheguei a fazer, com o mensalão do PT.
Entretanto, soe chamar a atenção sobre um aspecto que, dada a opressão das ideias dominantes, tem passado despercebido ou até desprezado pela maioria.
Trata-se do eterno confronto entre ideais e realidade.
Ignorar que pautamos, todos nós, nossas ações pela teoria do bem maior de Maquiavel é eliminar qualquer possibilidade de auto-conhecimento.
Desde o combate a insetos pela preservação de nossa saúde, por mais que necessitemos deles para a preservação do meio em que vivemos, até a troca do nosso tempo com os filhos pelo tempo no trabalho, quase tudo que fazemos tem algo de mal - em nossa própria avaliação - que se justifica em função de necessidades que julgamos mais importantes.
Quanto maiores forem nossas responsabilidades, maior será a necessidade de assim procedermos, se tenho uma empresa e preciso equilibrar as finanças, seja devido a fatores externos, seja por alguma falta de competência minha, sou obrigado a demitir empregados, os mesmos a quem tinha prometido a oportunidade de uma longa carreira.
Considerando o universo com que um político tem que lidar, universo esse contaminado pela cultura do "jeitinho", verificamos que se torna praticamente impossível ter sucesso na carreira política, sem o qual nenhum ideal pode ser minimamente defendido, sem enormes concessões. Isso, feliz ou infelizmente, é verdade para nós, para os suecos, para os japoneses, para os italianos e para todos os que se organizaram em sociedades, incluindo aí os animais ditos irracionais.
A partir dessas considerações, tenho que admitir que a corrupção não é o pior dos flagelos de uma sociedade, como quer nos convencer o arauto da escola republicana dos Estados Unidos, cujo viés é fortemente inclinado para a defesa das grandes corporações e sua ética do tipo: “se estou dentro é negociação, se estou fora é negociata, portanto devo combater a corrupção fora dos meus negócios”.
O que realmente impede o avanço de economias capitalistas democráticas é a concentração de poder (com a ressalva permanente de não achar nenhuma das duas fórmulas muito boas - capitalismo e democracia, embora não tenha ideia de nenhuma alternativa melhor para lidar com a loucura humana). É essa concentração de poder que, inconscientemente ou não, o Excelentíssimo magistrado favorece enormemente com sua caça às bruxas.
Ainda assim espero que essa ação se estenda mais um pouco, pelo menos para além do Eduardo Cunha.
Os problemas de uma sociedade, na minha opinião, são:
  1. Intolerância, sectarismo e maniqueísmo.
    Os líderes mais deletérios, de direita ou de esquerda, que surgiram no mundo, nasceram desses sentimentos que destroem a confiança, a única cola que une um grupo de pessoas em uma sociedade - além da língua, conforme a doutora Louise Banks do filme “A Chegada”.
    Não é porque o Haddad está no PT que tem que ser bandido, da mesma forma, não podemos condenar o Meirelles por fazer parte do grupo do Renan.
    Ideologias também não podem ser como religiões: todos os que pensam de tal forma estão certos e os outros estão errados. A verdade é que nenhuma fórmula deu certo ainda, o que estamos tentando é sobreviver e dar todas as chances para que algo novo possa surgir, para isso é preciso que as pessoas existam e tenham as mínimas condições de pensar e propor novas ideias;
  2. Concentração de poder, por um grupo muito pequeno e ou por um período muito longo.
    Precisamos buscar alternância de poder, promover um ambiente de competição na economia, incentivar as iniciativas, desburocratizar e diminuir a interferência do estado.
    Um trabalho de pós-graduação da FEA, apresenta resultados interessantes:
    Para o trabalho completo acessar o link: Política Fiscal - Fernando Siqueira
  3. Corrupção como ética vigente.
    Sobre isto, reconheço, o juiz já o disse muito bem.
Pois bem, acabo por concluir que PT, MST, Lula, Joaquim Barbosa, Sérgio Moro, Deltan e cia. representam o verdadeiro risco que corremos enquanto nação com pretensões de se tornar um ambiente seguro e confiável para se viver.
Como eles, vemos muitos outros personagens com o mesmo viés de radicalismo, açodamento e boquirrotice, como o juiz Gilmar Mendes, o ministro Eliseu Padilha, entre muitos outros.
Esses são muito mais perigosos pois aumentam o risco de radicalização e totalitarismo, principalmente nas circunstâncias que vivemos e dada a nossa adolescência cultural e, mormente, como democracia. Eles exacerbam extraordinariamente a intolerância, o sectarismo e o maniqueísmo, minando profundamente a confiança, já tão combalida em nossa sociedade.
Por incrível (e terrível) que pareça e feitas todas as ressalvas de praxe, figuras como Temer ou Renan acabam se mostrando muito mais preparadas para lidar com essas turbulências. Tudo isso me faz ter saudades de Ulisses e FHC, pasmem.

Insight

Interessante que, pensando nisso, tentei fazer um retrospecto da nossa história sob a minha percepção e cheguei a conclusões intrigantes.
A meu ver os momentos mais importantes na definição da nossa realidade foram:
  1. 1808 - D. João VI
    Abertura dos portos.
  2. 1930 a 1950 - Getúlio Vargas
    Estruturação da indústria nacional e das relações de trabalho.
    Implantação das indústrias de base e do monopólio do petróleo.
  3. 1964 a 1985 - Ditadura Militar
    Implantação da infraestrutura energética e apoio à engenharia nacional.
  4. 1990 a 1992 - Fernando Collor de Mello
    Abertura comercial
  5. 1995-2002 - FHC
    Privatizações
Minha análise tem como fundamento o resultado de cada um desses momentos para o país, em termos de aumento da atividade econômica e consolidação desse resultado para as gerações futuras.
Não acho que foram intrinsecamente bons, aliás alguns foram muito ruins - e sobre essa ironia volto a falar mais a frente - apenas que foram os que resultaram em algum progresso para que o país alcançasse a situação em que se encontra hoje, que, queiramos ou não, é melhor do que era a um século, inclusive com as privatizações - com este tópico só concordarão os que viveram os tempos da Telesp, já que os mais novos tendem a comparar a nossa situação com a de países desenvolvidos.
Isso me faz lembrar de uma conversa que tivemos, eu e meu sócio à época, Carlos, lá pelos idos de 85 em pleno governo Quércia, como sempre carregado de suspeitas de corrupção, desmandos etc.
O Carlos, com ar de interrogação, disse: - Você percebeu que, apesar de tudo, os serviços governamentais funcionam, de uma forma ou de outra, mal ou bem, mas funcionam.
E, a bem da verdade, era preciso concordar que não vivíamos um caos, as repartições públicas prestavam seus serviços, a polícia, bombeiros, lixeiros e todo o aparato do estado funcionavam de alguma forma.
Dizer que estamos mal e que esses governos não foram bons não será novidade nem mesmo motivo de polêmica, o fato é que o resto foi muito pior.
Nos intervalos entre os momentos que citei antes, ocorreram outros momentos importantes, entretanto considero que foram negativos, ou seja, não só não contribuíram para o progresso como o retardaram:
  • O governo JK que, com a ideia de queimar etapas - 50 anos em 5 - praticamente acabou com nossas esperanças de ter uma indústria desenvolvida.
  • A política de reserva de mercado que fez grandes fortunas e resultou em um atraso gigantesco em áreas importantes como a da informática.
  • Os governos de esquerda que, preocupados em distribuir renda e propriedade a qualquer custo, paradoxalmente, colaboraram muito para a concentração de poder na mão de poucos e levaram as finanças do país à bancarrota.
Isso tudo se revela mais um paradoxo: verificar que são os piores governos, sob o ponto de vista das liberdades individuais e da preocupação com os menos favorecidos, que conseguem produzir algum progresso econômico, do qual, ao final, todos acabam se beneficiando, ainda que, precariamente.

Teoria da conspiração


Outro dia recebi este link, falando da Lava-Jato:

Claro que pode ser apenas uma teoria da conspiração, mas me lembro bem que, quando disseram que naves americanas se aproximavam da costa brasileira, em 64, também achei que era paranoia.
Não é novidade que a falta de confiança disseminada em nossa sociedade suscita impulsos de recorrer a alguém mais forte: os militares e, no caso em epígrafe, os xerifes do mundo.

Eu até estou disposto a acreditar que essa turma seja "bem intencionada", que acham que do jeito que está não dá pra continuar e, principalmente, que foram eles que tiveram essas ideias.
Entretanto, esses sentimentos são um campo fértil para o aliciamento pelas forças que, de fato, comandam o mundo. Achando que precisavam recorrer à ajuda externa para romper com uma estrutura de poder altamente corrompida (falo da união latino americana dos ministérios públicos, a nova versão da "operação condor"), podem estar entrando na conversa desses poderosos. O que essa geração não aprendeu com a geração passada é que o "protetor" cobra seu preço.

E aí?

Volto a dizer, sem a evolução das consciências e, como nos ensinou Trotsky, que seja global, nada vai dar certo, mas por outro lado, não será o cataclismo dos profetas do apocalipse. Apenas continuaremos à procura de alternativas e é isso que vale. Estamos destinados a ser metamorfoses ambulantes ou ter aquela velha opinião formada sobre tudo.     
Algumas perguntas ficaram propositalmente no ar:
  • Se tudo foi testado em algum momento da história e nada mostrou estar no rumo certo, então, como foi que melhoramos?
  • E como virá esta revolução das consciências?
Primeiro, não se trata de revolução, queimar etapas nunca é a solução, embora muitas vezes seja necessário uma ruptura, a solução vem pela evolução das consciências.
A resposta de onde virá essa evolução, também responde porque sistemas que não deram certo resultaram em melhoria: porque qualquer sistema funciona onde as consciências são mais evoluídas.

Temos que reconhecer que a evolução, ainda que por vias que nos parecem tortas, está ocorrendo. Se a velocidade será suficiente ou se nós é que somos impacientes? Isso só em outro nível para responder.


“Qual é o objeto da arte? Se a realidade viesse atingir diretamente nossos sentidos e nossa consciência, se pudéssemos entrar em comunicação imediata com as coisas e com nós mesmos, estou certo de que a arte seria inútil, ou antes, que seríamos todos artistas, porque nossa alma vibraria então continuamente em uníssono com a natureza. Nossos olhos, ajudados pela memória, recortariam no espaço e fixariam no tempo quadros inimitáveis. Nosso olhar captaria de passagem, esculpidos no mármore vivo do corpo humano, fragmentos de estátua tão belos como os da estatuária antiga. Ouviríamos cantar no fundo de nossas almas, como música por vezes alegre, o mais das vezes lamentosa, sempre original, a melodia ininterrupta de nossa vida interior. Tudo isso está em torno de nós, tudo isso está em nós, e no entanto nada de tudo isso é percebido por nós distintamente. Entre a natureza e nós, apenas? Entre nós e nossa própria consciência um véu se interpõe, espesso para o comum dos homens, leve e quase transparente para o artista e o poeta. Que fada teceu esse véu? Terá sido por malícia ou amizade? Impunha-se viver, e a vida exige que apreendamos as coisas na relação que elas mantêm com nossas necessidades. Viver consiste em agir. Viver é aceitar dos objetos só a impressão útil para a eles reagir de modo adequado: as demais impressões devem se obscurecer ou só nos chegarem confusamente. Enxergo o que creio ver, escuto o que creio ouvir, analiso-me e creio ler no fundo do meu peito. Mas o que vejo e o que ouço do mundo exterior é simplesmente o que meus sentidos extraem dele para esclarecer minha conduta; o que conheço de mim mesmo é o que aflora à superfície, o que toma parte na ação. Meus sentidos e minha consciência só me proporcionam da realidade uma simplificação prática. Na visão que me dão das coisas e de mim mesmo, as diferenças inúteis ao homem são apagadas, as semelhanças úteis ao homem são acentuadas, as vias me são traçadas de antemão por onde minha ação enveredará. Essas são as mesmas pelas quais toda a humanidade passou antes de mim. As coisas foram classificadas com vistas à vantagem que poderei tirar delas. E é essa classificação que percebo, muito mais que a cor e a forma das coisas. Sem dúvida o homem é já muito superior ao animal nesse aspecto. É pouco provável que o olho do lobo faça uma diferença entre o cabrito e o cordeiro; ambos são, para o lobo, duas presas idênticas, igualmente fáceis de pegar, igualmente boas para devorar. Quanto a nós, distinguimos a cabra e o carneiro; mas distinguiremos uma cabra de outra e um cordeiro de outro? A individualidade das coisas e dos seres nos escapa sempre que não nos é materialmente útil percebê-la. E mesmo quando a observamos (como ao distinguir uma pessoa de outra), não é a própria individualidade o que nosso olho capta, isto é, certa harmonia inteiramente original de formas e cores, mas apenas um ou dois traços que facilitarão a identificação prática. Por fim, para resumir tudo, não vemos as coisas em si; limitamo-nos o mais das vezes a ler rótulos colados nelas. Essa tendência, fruto da necessidade, acentua-se ainda mais sob a influência da linguagem. Porque as palavras (com exceção dos nomes próprios) designam gêneros. A palavra, que só denota da coisa a sua função mais comum e o seu aspecto banal, insinua-se entre a coisa e nós, e lhe mascararia a forma a nossos olhos se essa forma já não se dissimulasse por trás das necessidades que criaram a própria palavra. E não são apenas os objetos exteriores, mas também nossos próprios estados de alma que se furtam a nós no que têm de íntimo, de pessoal, de originalmente vivido. Quando sentimos amor ou ódio, quando nos sentimos alegres ou tristes, será precisamente o nosso próprio sentimento que chega à nossa consciência com os mil e um matizes fugidios e as mil e uma ressonâncias profundas que fazem deles alguma coisa de absolutamente nosso? Se assim fosse, todos nós seríamos novelistas, todos seríamos poetas, todos seríamos musicistas. O mais das vezes, porém, só percebemos do nosso estado de alma o seu aspecto exterior. Só captamos dos nossos sentimentos o seu aspecto impessoal, aquele que a linguagem pode denotar de uma vez por todas, por ser quase o mesmo, nas mesmas condições, para todos os homens. Assim sendo, até em nosso próprio indivíduo, a individualidade nos escapa. Movemo-nos entre generalidades e símbolos, como num campo fechado no qual nossa força se confronta utilmente com outras forças; e fascinados pela ação, atraídos por ela, para nosso maior bem, no terreno que ela escolheu para si, vivemos numa zona intermediária entre as coisas e nós, exteriormente às coisas, exteriormente também a nós mesmos. Mas vez por outra, por distração, a natureza suscita almas mais desprendidas da vida. Não me refiro a esse desligamento desejado, calculado, sistemático, que é obra de reflexão e de filosofia. Falo de um desligamento natural, inato à estrutura do sentido ou da consciência, e que se manifesta de pronto num modo virginal, por assim dizer, de ver, de ouvir ou pensar. Se esse desligamento fosse completo, se a alma não mais aderisse à ação por alguma de suas percepções, seria a alma de um artista como o mundo jamais viu ainda. Seria superior em todas as artes ao mesmo tempo, ou então as fundiria todas numa só. Essa alma perceberia todas as coisas em sua pureza original, tanto as formas, as cores e os sons do mundo material como os movimentos mais sutis da vida interior. Mas é exigir demais da natureza. Mesmo para aqueles dentre nós que ela fez artistas, foi por acaso, e apenas parcialmente, que ela levantou o véu. Apenas numa direção ela esqueceu de ligar a percepção à necessidade. E como cada direção corresponde ao que chamamos de sentido, é por um desses sentidos, e apenas por esse sentido, que o artista em geral se consagra à arte. Daí, na origem, a diversidade das artes. Daí também a especialidade das predisposições. Um artista se aplicará às cores e às formas, e como ama a cor pela cor, a forma pela forma, como as percebe por elas e não para ele, é a vida interior das coisas que ele verá transparecer através de suas formas e cores. Ele fará a vida entrar aos poucos em nossa percepção a princípio confundida. Por um momento pelo menos ele nos desligará dos preconceitos de forma e cor que se interpunham entre nosso olho e a realidade. E realizará assim a mais alta ambição da arte, que é no caso a de nos revelar a natureza. Outros artistas se voltarão de preferência a si mesmos. Sob as mil ações nascentes que esboçam de fora um sentimento, por trás da expressão banal e social que exprime e recobre um estado de espírito individual, é o sentimento, é o estado de espírito que eles irão procurar simples e puro. E para nos induzir atentar o mesmo esforço sobre nós mesmos, eles se empenharão em nos fazer ver algo que terão visto: mediante arranjos ritmados de palavras, que chegam assim a se organizar juntas e tomar alento de uma vida original, eles nos dizem, ou antes, nos sugerem, coisas que a linguagem não foi feita para exprimir. Outros cavarão ainda mais fundo. Sob essas alegrias e tristezas que podem na pior das hipóteses traduzir-se em palavras, eles captarão algo que nada mais tem de comum com a fala: certos ritmos de vida e de respiração que são mais íntimos ao homem que os seus sentimentos mais íntimos, sendo a lei viva, variável com cada pessoa, de sua depressão e exaltação, de seus pesares e esperanças. Extraindo, acentuando essa música, eles a imporão à nossa atenção, farão com que nos insiramos involuntariamente nós mesmos, como passantes que entram numa dança. E com isso nos levarão a abalar também, bem no fundo de nós, algo que esperava o momento de vibrar. Assim, quer se trate de pintura, escultura, poesia ou música, o único objetivo da arte é afastar os símbolos inúteis na prática, as generalidades convencional e socialmente admitidas, enfim, tudo o que nos esconde a realidade, para nos colocar frente a frente com a própria realidade. De um mal-entendido sobre isso é que nasceu a celeuma entre o realismo e o idealismo na arte. Sem dúvida, a arte nada mais é que uma visão mais direta da realidade. Mas essa pureza de percepção implica uma ruptura com a convenção utilitária, um desprendimento inato e especificamente localizado do sentido ou da consciência, enfim, certa imaterialidade de vida, que vem a ser o que sempre se chamou de idealismo. Por conseguinte, pode-se afirmar, sem jogar de modo algum com o sentido das palavras, que o realismo está na obra quando o idealismo está na alma, e que só à força de idealidade se toma contato com a realidade.
BERGSON, Henri. O Riso

Condenados por opção

A expulsão do paraíso se deu quando Adão comeu do fruto da árvore do conhecimento e passou a ter um futuro para se preocupar e um passado para se arrepender, mas ganhou a possibilidade de ser artista.
Entretanto a imensa maioria de nós está preso à sua própria mente e às concepções que temos das coisas.
Para alguém assim fica difícil perceber a amabilidade de um motorista de ônibus, previamente classificado como “um cavalo”, de um atendente de uma loja ou restaurante, considerado de antemão um “malandro”, de alguém com quem cruzamos nas ruas etc..
Da mesma forma, essa pessoa encerrada em si mesma, não dará nenhuma chance àqueles que classificou previamente como mau caráter, ou de direita ou de esquerda, continuará cega para mudanças.
Como diz uma frase pichada por toda a cidade: Saia da bolha!
Quem só anda de carro, só se informa pela televisão, jornais e revistas, só frequenta os mesmos grupos, seja real ou virtualmente, reforça continuamente seus grilhões, transformando-se em um verdadeiro autômato comandado por uma força invisível que o prende a uma paródia do mundo criada por ele mesmo.
Para esse, conselhos ou livros de autoajuda não servirão de nada, nem mesmo as experiências vividas, pois que todas as percepções serão interpretadas pelo mesmo filtro.
Para esse, o mundo não evolui, porque, como aquele que não percebe o aumento da gasolina porque sempre põe dez reais, só vê o que já interpretou de antemão.



Dar chance ao erro, peripatetar por aí, polemizar suas próprias convicções é o único caminho para alguma libertação.