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Versão DemimPro6 de Podcast

A transcrição completa está na sequência.

Quem "se" acha vive se perdendo!

A origem das crianças

05/12/2020

Quando só tinha o nada, nada mesmo, nem ar tinha lá, nem luz, nem... nada, de repente surgiu um pensamento.

Fraquinho, como se fosse uma luzinha muito apagadinha, mas estava lá, naquele nada enorme e esse pensamento tinha duas palavras:

— Eu quero!

Quando esse pensamento pensou a palavra “eu” passou a existir no meio do nada, brotou, bem pequenininho - como aqueles brotinhos de feijão que a gente coloca no algodão com água, bem pequeninhos, que a gente até precisa de lente para enxergar.

Mas quando ele pensou “eu quero” foi uma explosão, ele faiscou como um relâmpago, ganhou força, energia, calor e, na mesma hora, veio a sua primeira dúvida: O que?

Foi aí que ele viu o mundo, que ele nunca tinha visto porque... bem, porque, na verdade, esse nosso broto de pensamento nem existia um segundo antes.

Ele viu o mundo e viu as pessoas e viu que era muito bonito, as pessoas brincavam, admiravam as belezas do mundo, trabalhavam, se amavam e decidiu:

— Já sei, eu quero ir pro mundo, é pra lá, não tenho dúvidas!

E aquele brotinho de pensamento percebeu que ele queria a beleza, queria poder amar, brincar. E ele viu que isso era bom.

Aqui alguém poderá objetar: Mas, como? Se não havia nada!

O fato é que antes de existir a “existência” não havia espaço-tempo, que foi uma invenção do pensamento, as coisas podiam estar lá antes mesmo de acontecerem.

Foi nesse momento que nasceu a Fé, assim mesmo, com “F” maiúsculo, que é a certeza do que se quer e porque se quer.

Querer viver para contemplar, produzir e compartilhar a beleza.

Aí ele viu que algumas pessoas se amavam tanto que desejavam ter filhos e, através desse desejo, conseguiam gerar esses filhos, e pensou:

— Então é assim que eu vou pro mundo!

E, na horinha que ele pensou isso, já estava na barriga da mãe. Até hoje ele não sabe como escolheu aquele casal, só sabe que não caiu ali por acaso, foi tudo como ele queria, desde o primeiro momento.

Pelo menos é assim que eu me lembro!

Preciso me encontrar

Em Feitio de Oração começo este primeiro Pádaqui, porque Preciso me Encontrar.

A estorinha que contei no início foi apenas para mostrar de onde vem essa estranha mania de ter Fé na vida!

No título, Quem "se" acha vive se perdendo! incluí um “se” maroto, que pode ser considerado sarcástico. Tem a ver com as certezas que alguns teimam em manter por maiores que sejam as incertezas evidentes destes tempos complexos.

Claro que isso sempre ocorreu. Os totalitarismos, por exemplo, nasceram de mentes que “se achavam” e, ao fim e ao cabo, se perderam e levaram à perdição povos inteiros. As origens desse fenômeno sempre foram a luta pelo poder e pelo acesso a recursos vitais, mas vivemos um tempo em que essa distopia pode ter origens mais graves.

Agora vou revelar, não um segredo, mas uma informação oculta, por assim dizer, contido no primeiro volume do DeMimPro6.

Para tentar entender a maior crise que a humanidade já enfrentou é necessário rever as origens e as causas dessa situação.

Nós começamos formando bandos.

O ser humano é fundamentalmente de natureza gregária, haja vista que a pena de prisão solitária é utilizada como punição extrema.

A nossa natureza gregária procurou resolver os problemas do medo, da colaboração e do melhor aproveitamento dos recursos, através da união.

A essência dessa estratégia sempre foi a CONFIANÇA, lembrando que esse é um sentimento de quem confia, confia porque avaliou que, entre as ameaças da vida isolada e a possibilidade de ser traído, o menor risco, seja pela sua probabilidade, seja pelo custo envolvido, era o segundo.

Claro que, ao mesmo tempo que unia dentro do bando, essa estratégia dividia entre bandos distintos.

Muito bem, assim foi por milhões de anos, com os bandos limitados a cem pessoas, que era o alcance da comunicação entre indivíduos e do estabelecimento de laços de confiança.

Até que apareceu o Sapiens e rompeu esse limite, como está muito bem descrito no livro homônimo (Sapiens - Uma Breve História da Humanidade, de Yuval Noah Harari).

Qual foi a grande invenção do Sapiens que permitiu ampliar, não só a quantidade de indivíduos de um bando, mas o alcance territorial desse bando?    
Ele inventou o mito!

Somos todos farinha do mesmo saco, o que difere o Sapiens do Neandertal é o lobo frontal, área que domina a imaginação e, consequentemente, nos permite mentir com perfeição!

Seria esse tal “lobo” frontal um “lobo” mau? Afinal Thomas Hobbes já nos alertava: "O homem é o lobo do homem!*"

* "homo homini lupus", frase que, na verdade, é do dramaturgo romano Plautus

Bela coincidência, a mesma palavra com significados tão diferentes acabando por servir à mesma ideia!

Nosso ilustre ancestral sacou que se ele conseguisse transmitir uma fantasia – ainda que levasse muito a sério suas crenças – poderia juntar pessoas não só de tribos, mas de regiões inteiras, até de continentes diferentes, porque, se esse mito se propagasse através, inicialmente da tradição oral, muitos séculos depois pela escrita, seja de qualquer outro meio de comunicação, ele conseguiria transmitir essa ideia, atraindo a confiança de muitos pelo poder do mito. Sobre as fontes da força dessas fantasias, o livro “O poder do mito” de Joseph Campbell dá pistas interessantes.

Aí fomos criando novos bandos, estávamos garantidos dentro de uma religião, dentro de um estado, unidos como indivíduos de uma nação, com um "Green Card", por uma ideologia.

Nos sentimos protegidos pelo bando pela maior parte de nossa história como sociedade, até que, de repente, começou uma nova revolução, a revolução liberal.

Curioso que essa revolução foi desencadeada justamente pelos mesmos que defendem o estado forte, a economia centralizada e outras características do socialismo.

Aos poucos fomos destruindo as bases sobre as quais repousava nosso equilíbrio psicológico.

O conceito (mito) de um deus onipotente, por exemplo, foi abalado por muitos pensadores.

O Paradoxo da Onipotência é um argumento que contesta a onipotência de um ser divino. Surgiu na Era Medieval e foi abordado por Tomás de Aquino (1225-1274). Sua forma popular mais conhecida é: “Pode Deus criar uma pedra que não consegue carregar?”. Caso sim, então não é mais onipotente; caso não, nunca foi onipotente.

Já que seu principal atributo não resistiu a um simples teste lógico, especulou-se então que deus seria uma criação do homem, e não o contrário como era a crença universal.

A revolução liberal começou na primeira metade do século XX, com Marcuse e a escola de Frankfurt, que hoje, de certa forma, serve de pretexto para um monte de ideologias, mas, enfim, era a libertação do homem, a libertação sexual, a libertação moral, a queda das religiões e a coroação da ciência como nova referência.

Tudo parecia muito lógico, afinal estávamos fazendo jus à expulsão do paraíso, havíamos finalmente digerido o fruto da árvore do conhecimento.

O que não percebemos é que com isso um monte de mitos foram derrubados. Derrubando esse monte de mitos o que se fez de fato foi desfazer um monte de bandos, um monte de tribos virtuais - afinal a realidade virtual não é uma invenção moderna, muito menos ligada à informática, ela foi inventada pelo Sapiens centenas de milhares de anos atrás. Nesse processo começamos a desfazer a única cola que une a gente em grupos, a CONFIANÇA.

A nação não é mais respeitada como um bom bando, as religiões muito menos e até a família já não é considerada um bom bando.

Paralelamente, todas as tradições e sabedorias acumuladas ao longo da história humana são esquecidas.

Precisamos ser “homens superiores”, o Übermensch, conceito central da obra de Nietzsche, ou seja acima das questões existenciais, livres da necessidade de deuses e religiões.

Extrema clareza é aterrorizante!

Nesse ambiente um poder se eleva acima de todos os outros: o MEDO! Esse é o ditador supremo do mundo atual, alimentando desde terrorismo até crises existenciais.

Aliás, hoje, a grande crise é existencial. Tantos suicídios, inclusive de jovens e crianças, se devem, principalmente, ao fato de não termos mais o sentido de pertencimento que os antigos mitos nos davam.

Ainda que estejamos experimentando a sensação de medo com mais frequência do que seria desejável, as evidências mostram que temos muito menos motivos para isso do que gerações passadas e, quanto mais para trás se olha, maior essa diferença.

As tentativas de criar novos mitos agregadores, como o cientificismo, incluindo as pseudo ciências, ideologias políticas, enfim, são conjuntos de ideias que não tem o poder e a profundidade dos mitos que sustentaram a humanidade até aqui, pelo simples fato de que se resumem a isso, ideias.

Os mitos que nos uniram nunca foram racionais, mas essencialmente emocionais, derivados ou do medo ou do amor.

Sarça ardente

E apareceu-lhe o anjo do Senhor em uma chama de fogo do meio duma sarça; e olhou, e eis que a sarça ardia no fogo, e a sarça não se consumia.

Êxodo 3:2

Da mesma forma que Moisés, Jesus e Maomé conseguiram inocular nos corações e mentes de bilhões de pessoas, por milhares de anos, uma fantasia escalafobética, Marx, Engels e Gramsci inocularam as mentes de muitos seguidores fiéis, com a promessa de salvação pelo estado proletário.

A essência dos dois mitos é a mesma, o fundamentalismo, isto é, quem acredita será salvo, quem se opuser está a serviço do mal. O medo como forma de aliciamento.

A diferença é que o primeiro é intensamente emocional e o segundo exclusivamente racional.

No blog DeMimPro6, lá em 2014, publiquei o ensaio Tesão&Taras, em que eu dizia que a humanidade se divide em duas sociedades que coabitam o mesmo espaço, ao mesmo tempo:

1.   As máfias, o chamado crime organizado, um sistema de governo baseado em Tesão & Taras que usa Missão e Valores como instrumento de poder: honra, lealdade, devoção à causa da “famiglia”;

2.   Os governos institucionais, sistemas baseados em Missão e Valores e que usam Tesão & Taras como instrumento de poder: marketing político, corrupção, aliciamento.

A segunda é a formal, a ideal, fruto da ilusão de que somos mais do que animais, a primeira é a real, onde somos mais humanos, ainda que considerada marginal pela segunda!

Essa dicotomia não é uma característica deste ou daquele momento da história da civilização, é “A” história da civilização e, na minha opinião, sempre será, porque no embate entre segurança e liberdade, a primeira nunca vai vencer a segunda.

O mais triste é que, não percebendo esse fenômeno, não conseguindo reconhecer o abismo de carência em que vivem, os jovens se jogam de cabeça em qualquer precipício fantasioso,  seja seguindo lideranças políticas, religiosas, filosóficas ou mesmo embarcando em ideologias radicais.

E, como na música folclórica americana:       
And it's been the ruin of many poor boys       
And God, I know, I'm one

Essa ingenuidade acabou agravando muito nossa condição psicológica, já que esses mitos "modernos" só convencem em níveis superficiais da consciência. Inconscientemente os novos apóstolos percebem as enormes inconsistências dessas fórmulas criadas artificialmente e com motivações muito mais egoístas do que autênticas.

A cada dia cresce o número dos desalentados, daqueles que só acreditam na ciência e rejeitam qualquer mito diferente desse e, como a ciência é o templo da dúvida, o espaço em que a incerteza tem que imperar, pela própria natureza da busca pela verdade, se veem pisando em areia movediça.

Gabinetes do ódio, comportamento policialesco, sectarismo, aversão ao diálogo, são fruto de mentes convictas, indivíduos que “se” acham, colocando todos os que pensam diferente no lado do “mal”!

Nunca houve tanta animosidade entre pessoas que, até um momento antes, faziam parte da mesma camaradagem.

Como em um círculo vicioso, há um mecanismo de realimentação através do ódio, em que as atrocidades eventualmente cometidas pelo outro lado acabam reforçando as convicções do grupo. Os marxistas, por exemplo, que denunciaram o nascimento do nazismo, consolidaram ainda mais suas convicções depois da grande guerra, da mesma forma os fascistas, que, momentos antes, haviam denunciado o movimento comunista, consolidaram mais as suas certezas depois do surgimento da cortina de ferro.

O medo se manifesta de todos os lados, há os que temem as moléstias e há os que temem as vacinas.

Após comermos do fruto proibido, subjugando as ideias ao escrutínio da lógica e da ciência,  as portas do paraíso se fecharam para nós e, mais grave, a partir de nossa visão cientificista e predominantemente cética da realidade, construir mitos ou "ideias" fortes o suficiente para voltar a nos reunir em bandos coesos, garantindo a estabilidade psicológica perdida, é cada vez mais difícil, senão impossível, porque a ciência se baseia no questionamento, na dúvida e no ceticismo, muito mais causadores de polêmicas e discordâncias do que de harmonia.

Paradoxalmente, o mesmo pensamento científico que nos possibilitou avançar nas tecnologias do conforto e na expansão de nossa espécie, está nos tornando céticos e carentes de sentido para a luta da vida.

Não se pode recuperar a ignorância perdida!

Os problemas ambientais não são nada frente aos problemas psicológicos decorrentes da ausência de referências absolutas!

Tente outra vez

O alerta do Raulzito é sutil, a racionalidade levada até os estertores da nossa psique está minando o único verdadeiro sustentáculo da cabeça, que é o coração.

Nada nos impede de criar novas formas de relacionamento, de sociedade e até de procriação, somos livres para isso, mas cada passo tem consequências e refletir um pouco mais a fundo, ligeiramente abaixo do evidente, daquilo que parece óbvio, se torna indispensável quando o nosso futuro e o futuro da própria espécie estão em jogo.


Lembrando os Tribalistas, se queremos dar um pé em deus, temos que ter fé na taba: Tribalistas

Lembrando dos inimigos do homem: depois do MEDO, a CLAREZA é o inimigo a enfrentar: Day is done

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