Direita, vou ver! 05/02/2015
Ok! A direita é o vilão e é na esquerda que a esperança pode vencer o medo. Será?

Especulação

Cada dia que passa tenho mais dúvidas do que certezas.
Pensando em nossas reivindicações históricas: democracia, liberdades individuais, distribuição de renda etc. e analisando sob a perspectiva da essência do ser humano, percebo alguns paradoxos.
Já falei muito de minhas ideias sobre altruísmo e egoísmo, como, cada vez mais, acho que o fator determinante para um ou outro é a disponibilidade de bens, ou seja, na escassez o altruísmo será muito mais raro e na abundância teremos muito menos egoísmo.
Sei que muitos dirão que, por mais abundância que detenham, as elites ainda assim serão egoístas. Não discordo, entretanto credito isso ao fato de vivermos um ambiente altamente carente de confiança.
É inegável que, em sociedades mais evoluídas sob o ponto de vista da confiança entre seus membros, existe muito menos concentração de renda e todos vivem muito melhor.
O problema que vejo agora é que, excetuando-se a China, que conseguiu reunir o melhor do comunismo com o melhor do capitalismo, ao menos sob o ponto de vista do desenvolvimento material de sua sociedade, todas as experiências de esquerda esbarraram na mesma dificuldade, a desmotivação causada pela impossibilidade de ficar rico.
Claro que nem todos querem ficar rico, mas observe o conjunto da humanidade, não exemplos isolados, as sociedades mais pujantes são aquelas que dão mais oportunidades de enriquecimento a seus cidadãos.
Atribuem ao Delfim a frase: fazer o bolo crescer, para depois dividi-lo”, entretanto me parece que há uma certa verdade na frase do não menos notável “Bob Fields” sobre o Mercosul: “quando pobres se juntam é pra ficar mais pobre”.
Seja qual for a visão política que se adote, não se pode negar que dividir o pouco não resolve nossos problemas. Acontece que o sistema que tem permitido a abundância é o liberal, o sistema de mercado, o capitalismo.
A concentração de renda é o vilão, não o capitalismo. Quando a esquerda reivindica a divisão do bolo é porque alguém construiu esse bolo, normalmente os grandes capitalistas.
Interessante notar que nas sociedades mais capitalistas a expressão que se tornou sinônimo de vitorioso é “capitão de indústria” enquanto em nossa pátria lusófona definimos o grande capitalista como “barão” do café, “barão” da borracha etc.
Essa diferença já mostra um viés cultural: trabalho x nobreza.
Uma coisa assustadora é como a complexidade das estruturas sociais é usada, conscientemente ou ingênuamente, para construir sofismas. Falam de justiça social, distribuição da riqueza, tarifa zero, sem nenhum constrangimento, como se riqueza caísse do céu.
Voltamos à questão básica: fala-se muito de direitos, mas e os deveres? Fala-se do que o estado deve fazer pelo cidadão, mas e sobre o que o cidadão pode fazer pela sociedade?
Sempre defendi que a negação de algo não leva a nada, a única coisa que constrói é a afirmação da alternativa que se propõe. O fato é que isso não existe no discurso da ‘nova esquerda’, essa coisa meio anarquista, meio niilista, que vem dominando as mentes, justificadamente indignadas e insatisfeitas, mas que se contentam com a desconstrução.
Por quê será que a riqueza vem justamente do lada negro da força?
Simplesmente porque, infelizmente, Luther King estava certo ao citar Goethe: “O que me preocupa não é o grito dos maus. É o silêncio dos bons!”. Os bons são silenciosos por natureza, embora ainda esteja por ser definido o que é ser bom.
É justamente essa dúvida que desautoriza as propostas de participação popular, através de entidades representativas, que apenas criam mais instâncias para proliferação dos vírus e bactérias que infectam os indivíduos - vaidade e egoísmo, enfatizando justamente o que mais alimenta esses elementos patogênicos da sociedade, a desconfiança.
Isso não poderá ocorrer em um ambiente em que se nega a capacidade de empreender, de assumir riscos, de liderar as transformações, não como se fossem aspectos que estivessem escasseando, mas como se nunca tivessem existido.
Um ambiente em que se equipara o trabalho de um operário ao de um ‘capitão de indústria’, como se a entrega necessária em ambos os casos fosse similar.
Um ambiente que, ironicamente, prega que o primeiro deve ter todas as benesses do estado enquanto o outro deve se virar, já que ‘naturalmente’ tem mais recursos.
Nesse ambiente, é evidente que, sendo os poderosos mais hábeis e melhor estruturados, são estes que vão definir as regras do jogo, garantindo para si as benesses do estado e deixando os operários largados à sua sorte. Ou seja, edificamos uma selva onde quem pode mais chora menos.
Ou cortamos essa lógica pela raiz ou estamos fadados ao fracasso como sociedade.
Só o estabelecimento de uma relação de confiança entre as pessoas pode garantir uma estabilidade mais ou menos duradoura à sociedade, independente do sistema ser de esquerda ou de direita.
Confiança e sociedade
Por Saragoça da Matta
jurista português

publicado em 21 Nov 2014 - 08:00
Uma sociedade em que a análise da experiência demonstra que dificilmente poderemos confiar em certo tipo de pessoas, ou instituições, está condenada à desagregação



Confiança pode definir-se como segurança, certeza, como a entrega sem medo de perda ou de sofrer dano. Pode também significar tranquilidade, sossego. Confiar é ter fé. Acreditar.
A confiança é fruto, necessariamente, das experiências vividas pelo sujeito. Para usar as palavras de Camões, a confiança será resultado de um saber de experiências feito. A confiança surge igualmente da experiência alheia: se alguém que já nos oferece segurança, pelo apuro e pela honestidade das opiniões, nos transmite confiança relativamente a algo ou alguém, seremos também encorajados a acreditar. São cadeias de confiança: confio porque alguém em quem deposito confiança me assevera que o posso fazer.
Ao gerar sentimentos de tranquilidade e sossego, a confiança faz-nos reduzir o grau de vigilância. Ficamos certos de algo, pelo que mais facilmente nos revelamos e partilhamos a nossa intimidade e sentimentos. A confiança, portanto, erige-se como base de vivência quotidiana - na vida privada, na vida social, na vida pública.
Até relativamente a nós próprios assim é: se sabemos que nos saímos bem em certas situações, a tranquilidade com que as abordamos é superior à que existiria se as experiências anteriores tiverem gerado em nós sensações de incerteza. E se assim é quanto a nós, por maioria de razão o é relativamente ao mundo que nos rodeia: seja aos nossos semelhantes individualmente considerados, seja às instituições.
Não é pois de estranhar que a análise psicológica e sociológica da confiança utilize em tão grande medida a estrutura sociopolítica - e a actuação dos políticos - como manancial de exemplos de confiança.Rectius, de falta de confiança. É que é precisamente o saber de experiências feito que nos leva a gerar segurança naquilo que é afirmado por quem exerce poder na comunidade política. Só por isso se fala em confiança política, em homens de confiança, em voto de confiança. Também o mundo dos negócios, desde sempre e para sempre, assentará na existência e densidade da confiança: quem não a merece não tem crédito.
A confiança anda de mão dada com a honestidade, a probidade, a lealdade, a transparência e o crédito que merecemos e nos merecem os demais.
E se é certo que assenta sempre em experiências anteriores, então é produto por excelência da análise estatística que como indivíduos e como colectividade fazemos: seja uns dos outros, seja dos grupos, seja do todo.
Em suma, como etimologicamente se descobre, ter confiança é ter fé. É um puro mecanismo psicológico. Mas fundamental à vida em sociedade. Perdendo a confiança em alguém, ou numa instituição, tenderemos a excluí-la do nosso círculo, da nossa convivência. Não lhe daremos crédito. Não a consideraremos proba, nem leal, nem honesta, nem transparente.
Ora, uma sociedade em que a análise da experiência demonstra que dificilmente poderemos confiar em certo tipo de pessoas, ou instituições, está condenada à desagregação: a comunidade política no seu todo sofre com essa desagregação. É um factor em si mesmo potenciador da desagregação. Dito de outro modo, quanto menos confiança temos uns nos outros, e nas instituições, menor será a confiança que no momento seguinte sentiremos.
A desconfiança é a afirmação de que não conseguimos antecipar o comportamento dos outros, ou, ainda pior, a declaração de que conseguimos fazer tal previsão no sentido de que esses outros nos serão infiéis, frustrarão expectativas, violarão as regras.

É essa desconfiança que floresce, e a sociedade que se desagrega, sempre que a corrupção, o peculato, o tráfico de influências e todo o tipo de fraudes, fiscais e bancárias, fazem o seu curso.

Um comentário:

  1. Uma provocação: o que vc achou do nível de confiança no Canadá? Pq pra mim isto já explica muita coisa... Nos meus anos de Mestrado, o que mais me chamou atenção é podemos complicar indefinidamente os "sistemas" legais, políticos, econômicos, sociais, que sempre haverão "brechas".
    Em Economia se diz que "todos os contratos são imperfeitos", pq carregam o interesse das partes em enviesá-lo, e na maioria das vezes, o lado mais forte tem êxito nessa "roubada de jogo". Pq no fundo, o que faz um contrato ser ou não ser bem-sucedido, é a mesma característica que vale para qualquer relação humana: CONFIANÇA.

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